sexta-feira, 28 de novembro de 2008

PAN-CINEMA PERMANENTE: o sorriso de Waly

Waly Salomão (1944-2003)


O documentário sobre o poeta e compositor baiano Waly Salomão, morto em 2003, aos 59 anos, tem qualidades dimensionais. Mas o que de pronto me emocionou vendo a história do autor de Vapor Barato (junto com Jards Macalé) foi sua capacidade de integração.

Ele integrava-se a qualquer coisa, a qualquer um, numa pronta-aderência impressionante. Ou melhor, puxava os outros para si. Daí a perfeita sincronia do título do filme pensado e dirigido por Carlos Nader: Pan-cinema permanente. Para Waly tudo era movimento, ação. Toda sua poesia se baseia nessa veia, nessa verve da poiesis à la Grécia antiga, como é comentado no filme.

De tudo que vi, desde a entrevista de Waly para uma TV síria, em Damasco, suas viagens ao Amazonas, à Europa, suas conversas e performances, entremeando sempre realidade e teatralidade, o depoimento de seus dois filhos e dos amigos, como Caetano Veloso e Antônio Cícero, dentro da emoção pela narrativa do documentário, o mais contagiante, aliado aos gestos, é o sorriso espontâneo do poeta.

Era como se houvesse vida demais, e havia, numa dimensão lírica contagiosa e infalível, da qual o outro não podia escapar. O próprio Caetano Veloso disse que Waly era excessivo, mas nem por isso era ruim ficar do seu lado. E dos amigos que se foram, é dele que mais sente falta.

Ao longo do documentário, Waly recitou algumas vezes um poema que fala da fusão entre o eu e o outro (do livro Algaravias), a ruptura da fronteira que integra todas as coisas, todos os contrários, sonho e realidade, razão e loucura:

"Cresci sob um teto sossegado,
meu sonho era um pequenino sonho meu.
Na ciência dos cuidados fui treinado.

Agora, entre meu ser e o ser alheio
a linha de fronteira se rompeu."


É essa mistura essencial, esse ser contagiante que aparece no documentário. Esse sorriso que mostra todos os dentes, esse sorriso que mostra a alma.

2 comentários:

Anônimo disse...

Bem legal o seu blog, Gilberto, cheio de coisas interessantes. Encontrei ele procurando pelo Cavaleiro da Tristíssima Figura na Net.
Por mais quixotesca que essa vida de blogueiro seja, não desista de escrever!
Grande abraço,
Rafael.

Gilberto G. Pereira disse...

Muito obrigado, Rafael! O autor de um blog é mesmo como Dom Quixote se olhando no espelho, né (rs)!