quinta-feira, 28 de maio de 2020

Breve história da humilhação: fragmento do livro México, de Erico Verissimo


Em seu livro de viagem México (1957), Erico Verissimo (1905-1975) conta a história (à qual ele dá o título irônico de O Herói) de um coronel do exército legalista na Revolução de 1910, que foi pego pelos revolucionários comandados por Emiliano Zapata, julgado sumariamente e condenado à morte por fuzilamento.

E aí, o que Verissimo narra é digno de nota justamente por mostrar como nenhuma bravura consegue superar a capacidade humana de criar mecanismos de humilhação e maldade. Às vezes, a operação é simples, como esta, mas eficaz. Verissimo ouviu o relato do grande pintor mexicano David Alfaro Siqueiros (1896-1974).

Ao ser feito prisioneiro, “o coronel não se defendeu, não pediu clemência, não pronunciou uma palavra durante o julgamento. Recebeu a sentença sem mover sequer um músculo da máscula face. Saiu da sala pisando firme, a cabeça erguida, o porte ereto. Na prisão, onde aguardava com outros condenados a execução da sentença de morte, recusou-se a receber a esposa, que, tendo sido informada do acontecido, viera desesperada e em pranto pedir aos revolucionários que poupassem a vida do marido. ‘Retire-se!’, gritava este sem a mirar. ‘Não peço, nem quero clemência. Volte para casa!’

Numa dada madrugada, os guardas levaram os priosoneiros para o local de fuzilamento. Na porta da prisão, estavam as mães, as mulheres e os filhos dos condenados, inclusive a mulher do coronel. Quando eles passaram, o clamor começou e os acompanhou até o local do fuzilamento. 

“A esposa do coronel caminhava ao lado do marido, pendurava-se-lhe nos braços, no pescoço, beijava-lhes as mãos, que ele tinha amarradas às costas, mas o homem continuava a caminhar imperturbável, como se ela não existisse.”

A caminhada, no entanto, era longa, e a postura do coronel foi mudando aos poucos no percurso. “O homem agora não caminhava teso; a cabeça lhe caía sobre o peito e seus passos eram menos firmes. Ele já olhava para a esposa com um misto de ternura e pena.”

Ali, ele já estava quebrado. Talvez haja valentões que suportem mais, ao saberem que vão morrer. Mas ali o bravo coronel já estava partido ao meio. “Sua expressão transformou-se em terror quando, no alto do cerro, ele viu o primeiro companheiro cair diante do muro, crivado de balas. Haviam-no deixado para o fim, e ele tinha de olhar ou pelo menos ouvir o fuzilamento dos outros, em meio aos gritos de desespero das mulheres.”

“Clareava a barra do horizonte. Galos amiudavam. Soprava um ventinho frio. Ouviu-se nova descarga. O fuzilado tombou. Seu sangue respingou o muro. O tenente aproximou-se do corpo, tirou o revólver e deu o tiro de misericórdia na cabeça do agonizante.”

“Nesse momento, o orgulhoso coronel soltou um urro e atirou-se no chão, chorando como uma criança, e começou a pedir em altos brados que não o matassem. Beijou, babujou a mão do comandante do pelotão, enlaçou-lhe as pernas como uma fêmea desprezada e louca de paixão, e acabou rolando na poeira, o corpo dobrado, os joelhos contra o peito, a cabeça entre as mãos, recusando a erguer-se e marchar para o muro como um bravo.”

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sábado, 2 de maio de 2020

A gastronomia segundo Brillat-Savarin


Jean-Anthelme Brillat-Savarin (1755-1826) foi um juiz francês que viveu num dos períodos mais conturbados de seu país, entre a segunda metade do século XVIII e a primeira do XIX. A Revolução Francesa quase lhe tirou a cabeça, mas não foi por isso que ele entrou para a história.

Quem o colocou lá foi seu livro A fisiologia do gosto (Companhia das Letras, 2005, 384 páginas), um tratado bem-humorado e cheio de verdades sobre a gastronomia, que o colocou na boca de personagens de cinema e nas conversas de chefs de cuisine no mundo inteiro.

Para o autor, todos os campos do conhecimento humano acabam tangenciando o universo gastronômico, desde a física, a história natural, a química, a própria culinária até o comércio e a economia política. Para falar de gastronomia, ele usa todas essas referências, e seu texto enriquece com isso.

“A influência da gastronomia se exerce em todas as classes da sociedade; pois se é ela que dirige os banquetes dos reis reunidos, também é ela que calcula o número de minutos de ebulição necessários para que um ovo fresco seja cozido ao ponto”, diz.

Sinceridade e graça

Segundo Brillat-Savarin, os conhecimentos gastronômicos são necessários a todos os homens, embora os mais ricos sejam os que mais precisam deles em função de suas relações amplas dentro da sociedade, seus encontros políticos, posturas diplomáticas e reuniões de negócios. Mas são úteis também ao homem simples, pelos laços de amizade que esse conhecimento proporciona, ao saber fazer uma boa comida.

Publicado originalmente em 1825, um ano, portanto, antes de o autor falecer, A fisiologia do gosto é um livro peculiar do gênero pelo fino senso de humor de Brillat-Savarin. As definições de cada sensação ou de determinadas posturas são sinceras, mas escritas de forma graciosa. 

Ele define o apetite, por exemplo, como o monitor do corpo que avisa quando a contínua perda de nutrientes ameaça parar o funcionamento orgânico: “O apetite se anuncia por um certo langor no estômago e uma leve sensação de fadiga”, comenta.

Cegos gastronômicos

Nesse ritmo de conversa e ensinamento, o autor vai pontuando a complexa engrenagem da gastronomia. Fala dos sentidos, incluindo um sexto, que ele chama de ‘genésico’ ou ‘amor físico’, cujo estímulo pela boa comida é responsável por grande parte do prazer que o homem tem ao se alimentar, chegando próximo ao prazer do orgasmo. Mas adverte que nem todos são dotados de boa língua.

A língua de alguns desafortunados, diz ele, “é mal provida de terminações nervosas destinadas a absorver e apreciar os sabores. Estes suscitam-lhes apenas uma sensação obtusa; em relação aos sabores, são como cegos em relação à luz”, finaliza. 

Como exemplo de ‘cegos’ gastronômicos, Brillat-Savarin cita Napoleão Bonaparte, que “comia depressa e mal”. Neste caso, o autor demonstra aqui a vocação da gastronomia para a slow food em contraposição à fast food, que se tornou quase padrão no mundo veloz de hoje.

O livro passeia pelas dicas e receitas de como escolher um bom restaurante, os tipos de bebidas e suas combinações, fala de especialidades, da sede, da fritura, do prazer da mesa, da digestão, do sono, dos sonhos, da obesidade, da magreza, do jejum, da morte, da gastronomia clássica e até do fim do mundo. 

O que não se sabe é o que ele tinha comido quando lançou sua filosofia sobre os últimos dias sobre a terra. Em todo caso, nessas reflexões, ele diz que não vale a pena imaginar grandes catástrofes sobre o mundo, porque nada nesse universo conspiraria tão grandiosamente sobre nós, pois “não valemos tamanha pompa”.


Aforismos

O autor abre seu livro com uma série de aforismos que servem como trilha rumo ao que o leitor poderá encontrar nas páginas seguintes. 

1) O universo nada significa sem a vida, e tudo o que vive se alimenta.

2) Os animais se repastam; o homem come; somente o homem de espírito sabe comer.

3) O destino das nações depende da maneira como elas se alimentam.

4) Dize-me o que comes e te direi quem és.

5) O criador, ao obrigar o homem a comer para viver, o incita pelo apetite, e o recompensa pelo prazer.

6) A gastronomia é um ato de nosso julgamento, pelo qual damos preferência às coisas que são agradáveis ao paladar em vez daquelas que não têm essa qualidade.

7) O prazer da mesa pertence a todas as épocas, todas as condições, todos os países e todos os dias; pode se associar a todos os outros prazeres, e é sempre o último para nos consolar da perda destes.

8) A mesa é o único lugar onde jamais nos entediamos durante a primeira hora.

9) A descoberta de um novo manjar causa mais felicidade ao gênero humano que a descoberta de uma estrela.

10) Os que se empanturram ou se embriagam não sabem comer nem beber.

11) A ordem correta do comer é dos pratos mais substanciais aos mais leves.

12) A ordem correta do beber é dos vinhos mais suaves aos mais capitosos e perfumados.

13) Afirmar que não se deve mudar de vinhos é uma heresia; o paladar se satura; e, depois do terceiro copo, o melhor vinho não provoca mais que uma sensação obtusa.

14) Uma sobremesa sem queijo é uma bela mulher a quem falta um olho.

15) Aprende-se a ser cozinheiro, mas se nasce assador.

16) A qualidade mais indispensável do cozinheiro é a pontualidade: ela deve ser também a do convidado.

17) Esperar muito tempo por um conviva retardatário é falta de consideração para com os que estão presentes.

18) Quem recebe os amigos e não dá uma atenção pessoal à refeição que lhes é preparada não é digno de ter amigos.

19) A dona da casa deve sempre ter certeza de que o café é excelente; e o dono, de que os licores são de primeira qualidade.

20) Entreter um convidado é encarregar-se de sua felicidade durante o tempo todo em que estiver sob nosso teto.

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sexta-feira, 1 de maio de 2020

Gastronomia: o poder do alimento como vínculo social

                                                                                                                                                                             Foto: Divulgação
L’entrecôte: prato francês feito por um bistrô que virou moda no mundo das franquias (e já está em Goiânia)


Parênteses: Escrevi esta pequena reportagem em 2010, publicada no jornal Tribuna do Planalto, em Goiânia. Mas o jornal renovou seu conteúdo online, e o texto se perdeu. Então decidi ressuscitá-lo aqui. 

A única coisa que desatualizou a informação sobre o restaurante do chef André Barros, que estava prestes a ser inaugurado na ocasião. Foi de fato inaugurado, mas já fechou as portas. As ideias de Barros, no entanto, e o modo como ele vê a gastronomia continuam valendo. 

O texto entra aqui pelo vínculo com a literatura, já que cito três nomes importantes para quem gosta de ler. Feita a ressalva, boa leitura!

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Quem nunca foi convidado para um almoço ou um jantar? Quem, mesmo que tenha sido na infância, não ofereceu a alguém um pedaço de pão com o intuito de fazer amizade, desfazer mal-entendidos? 

A comida sempre foi um elemento poderoso nas relações sociais. Elemento essencial da vida, é uma força capaz não só de matar a fome, mas também de criar vínculos entre pessoas.

Como laço de convívio social, o alimento pode ser usado para nutrir uma amizade, mas também para desfazer vínculos, pode inclusive virar armadilha para capturar o inimigo. É tão importante na cultura anglo-saxã que a frase usada pelos ingleses para dizer que a comida não lhe caiu bem é “the food didn’t agree with me” (“a comida não concordou comigo”).

De acordo com o chef de cozinha, André Barros, a gastronomia não é privilégio dos profissionais, pelo contrário, faz parte de uma rede de sociabilidade que leva as pessoas às casas umas das outras ou aos restaurantes. 

“O fechamento de um contrato de negócios, o início de um namoro, a visita à casa da namorada ou do namorado para conhecer os futuros sogros, nessas ocasiões sempre há uma boa comida para acompanhar”, diz Barros.

“Quanto melhor for o cardápio e o tempero, com maior naturalidade a conversa fluirá, mais harmônicos ficarão os ânimos, e mais positiva será a impressão entre as partes”, acrescenta o chef.

A cerimônia do alimento na cultura ocidental atravessou muitos costumes e valores até chegar aos dias de hoje. Agora concorre com um tipo de alimentação pouco agregador, que é a fast food (alimentação rápida). 

A fast food prega o contrário da harmonia. As pessoas não conseguem se relacionar na hora da refeição. É rápido demais, prático, e o estômago se sacia com a mesma velocidade das conversas ralas, quando há alguém com quem conversar.

É contra esse massacre que entra o papel da gastronomia. Ela preza pelo que se chama slow food (alimentação saboreada sem pressa), que no Brasil começa a reagir sobre o avanço do pouco mastigar das comidas rápidas. 

Vontade de voltar

A gastronomia “é o conhecimento fundamentado de tudo o que se refere ao homem, na medida em que ele se alimenta”, diz Jean-Anthelme Brillat-Savarin, um juiz francês do século XVIII, que escreveu A fisiologia do gosto, livro que se tornou um clássico da área.

Brillat-Savarin era um amante da boa comida, mas também um entusiasta da amizade, da moderação e do prazer adquirido numa mesa bem-posta. Muito antes dele, no entanto, antes mesmo do nascimento da cultura ocidental, a alimentação como vínculo social já era compreendida e cultivada em várias civilizações, como na Grécia Antiga. 

Segundo Junito de Souza Brandão, em seu livro Mitologia Grega (Vol. I), determinados alimentos têm um poder de fixação muito grande. Quem os come não resiste à vontade de voltar ao local onde os comeu para saboreá-los de novo. 

O autor cita o mito grego de Perséfone que foi raptada por Hades, o senhor dos mortos e deus da riqueza. A pedido de sua mãe Deméter (Ceres, deusa da terra cultivada, de onde vem a palavra cereal), Perséfone teria de voltar à terra, junto aos mortais. 

Hades não podia negar a solicitação de Deméter, mas não queria ficar sem ver a amada. Então pediu a ela que comesse uma semente de romã. Com isso, mesmo voltando para junto da mãe, Perséfone teria de retornar e ficar um terço do ano nas “terras brumosas do Hades”, num eterno ciclo de idas e vindas.

Segundo Brandão, o poder de fixação de certos alimentos ultrapassa o limite do simbólico, e chega aos dias de hoje ajudando a manter boa parte das relações sociais, do nascimento de novas amizades. 

Brandão também cita Câmara Cascudo, estudioso da cultura popular brasileira, para dizer algo semelhante ao que já dissera da cultura grega: “Quem come e bebe certos alimentos ou líquidos não pode esquecer ou deixar de regressar aos lugares onde os consumiu.”

Na lista de comidas e bebidas que têm esse poder de fazer o apreciador regressar, diz Brandão, incluem o Cabrito assado do Cáucaso, o “Puchero” da Argentina, a “Olla podrida” da Espanha, o “Porridge” da Escócia, o Iogurte da Bulgária, o Pato de Rouen (cidade próxima a Paris), o “Coq au vin du Languedoc”, o Vatapá e o Caruru da Bahia, a Água da Fontana di Trevi, em Roma, o Açaí de Belém do Pará, entre muitos outros de tantas outras regiões. 

Para o açaí, existe até uma quadrinha que reforça o poder de fixação do alimento: “Quem vai ao Pará,/ parou./ Bebeu açaí,/ ficou.”

André Barros não foi ao Pará, mas viajou para bem próximo. Foi para Manaus, local aonde retorna sempre. Segundo o chef, toda vez que viaja para lá, a trabalho ou não, vai ao restaurante preferido comer uma Caldeirada de Tambaqui.

Este, no entanto, não é o único prato que faz Barros chegar a Manaus já com água na boca. “O Tacacá e o Filé de Pirarucu com Tucupi (caldo da mandioca brava) são outros dois pratos deliciosos. Gosto muito dessa cozinha regional brasileira”, enfatiza.

Respeito pela comida

Quando o assunto é gastronomia, Barros não perde o fio da meada. Começa logo a falar de seus projetos de culinárias, de receitas e até de um restaurante que está prestes a inaugurar em Goiânia, o Malauí, nome de um país do sudeste da África, de origem banta, que quer dizer “fogo”, “chama”.

A ideia de Barros é justamente fazer em Goiânia o que, segundo ele, ainda existe pouco em termos de gastronomia, um espaço que valoriza também a arte de apreciar o convívio social. 

O restaurante que está prestes a inaugurar, com área climatizada de 60 lugares, oferecerá um lounge e um ambiente para pocket shows, como jazz, blues, bossa nova, performance de DJs e stand-up comedy.

Além disso, haverá um fumoir, com seleção de charutos cubanos e nacionais, e uma pequena butique gastronômica na recepção. Dentro desse projeto, Barros quer dar continuidade àquilo que já sabe fazer muito bem, comida que desperte nas pessoas a vontade de voltar para comer mais.

Trabalhando atualmente no restaurante do Country Clube, o Bobó de Camarão que ele faz lá é muito apreciado. É um bobó mais encorpado, com lascas de coco fresco e castanha do Pará. 

“Há pessoas que acompanham o boletim do clube e vão lá pelo menos uma vez por mês. E se têm uma visita aqui em Goiânia, levam para conhecer essa releitura que fiz do bobó”, comenta Barros, orgulhoso.

Orgulho maior, ele sentiu quando o empresário carioca Max Araújo veio do Rio de Janeiro para fechar sociedade com ele na abertura do Malauí. Araújo é o investidor no negócio de mais de R$ 1 milhão. 

Araújo também é um grande connoisseur de gastronomia, tendo possuído restaurantes bem frequentados no Rio de Janeiro, além de já ter viajado para muitos países. Por onde passa, traz uma história de vínculo social proporcionado pela gastronomia.

Araújo e Barros, portanto, comungam os mesmos ideais. Ambos mantêm um profundo respeito pela comida, acham inclusive que ela tem sentimento, na medida em que é feita com amor, envolta a afetividades, elementos que acabam sendo transmitidos junto com os ingredientes à pessoa que vai comer. 

O caso mais ilustrativo dessa história de vínculos por meio da comida é a própria visita de Araújo a Goiânia, quando Barros ofereceu um jantar para receber o sócio. Araújo aproveitou a ocasião para convidar as pessoas que ele gostaria de agradecer e de conhecer melhor. “O resultado foi uma reunião de conversas agradáveis”, diz.

Ecos agradáveis

A experiência internacional dos dois também dá boas histórias de sociabilidade construída em torno de um bom prato, que também reforça a mística da fixação. Neste caso, Araújo cita um pequeno restaurante (bistrô) chamado L’entrecôte, em Paris (vale abrir um parêntese aqui para explicar que no fim de 2009, já estava chegando ao Brasil uma franquia desse bistrô, e atualmente, em pleno 2020, há uma rede gigantesca dele espalhada pelo país, que seguiu o exemplo do mundo inteiro; mas Araújo estava se referindo era mesmo à matriz, em Paris).

As pessoas ficam duas horas numa fila, muito bem organizada e plena de atenção, no L’entrecôte, para comer filés em tiras, acompanhados de um molho (cuja receita é mantida em segredo) e batatas fritas em caracol. “Sempre que vou a Paris me sinto atraído pelo restaurante, para comer aquele prato”, diz.

Um dos diferenciais do “L’entrecôte, diz Araújo, é o atendimento feito pelas duas chefes, que vão de mesa em mesa conversar com cada um dos clientes. “Elas são impressionantes. Têm um bom papo e são atenciosas. Por isso, já vi gente do mundo inteiro lá. Vão para comer, mas também para fazer amizade, conversar. Ou seja, a comida é o poder desse local”, comenta.

As histórias de Barros e Araújo são tantas e tão variadas, com cheiros, sabores e ambientações diversificados que, para quem escuta, ficam como ecos agradáveis na memória. Eles reforçam que o Malauí, com previsão de ser inaugurado no começo de dezembro (2010), terá espaço para todas essas delícias que giram em torno da gastronomia.

O Brasil tem uma afabilidade natural, e a comida faz parte dela. A feijoada e o churrasco, por exemplo, são manifestações populares de reuniões gastronômicas. Quem se propõe a conhecer o país e não se interessar por esses dois grandes pratos não chegará a tocar na essência do brasileiro. 

Por ouro lado, numa descrição mais sofisticada da gastronomia, um de seus elementos é a moderação, conforme lembra Barros. “Comer, sim, se empanturrar, não”, diz. Segundo o chef, em termos de variedade gastronômica, o Brasil ainda precisa aprender muito. Já em termos de ingredientes, é um dos mais ricos do mundo. 

O que falta é a exploração dessa riqueza. “Mas isso está melhorando. Hoje em dia, há pessoas que viajam atrás de comida, os chamados fooders, que vão a festivais conhecer a comida de um chef, tomar um vinho diferente. São pessoas que vão à feira, pesquisam ingredientes, conversam umas com as outras, descobrindo o país. Neste sentido, estamos vivendo um boom enograstronômico”, diz Barros.

(Gilberto G. Pereira. Publicado originalmente no jornal Tribuna do Planalto, em 20/06/2010)

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