domingo, 17 de fevereiro de 2008

A ARTE QUER QUE SE OLHE AO REDOR

Ilustrador: Weil
Ilustração de uma cena de O coração das trevas


Em Conrad’s preface to his works (London; J.M. & Dent and Sons Ltd), o escritor ucraniano, naturalizado britânico, Joseph Conrad, deixou uma série de textos que ele mesmo escreveu como prefácios ideais de seus livros. No trecho abaixo, ele fala do objetivo da arte como exercício de encantamento. A criação do belo deve levar em conta essa força, que faz o espectador olhar ao redor. Para o autor, a arte é o adorno, é o belo que se coloca em volta das coisas existentes e imaginárias. Só para lembrar, Conrad é conhecido por causa de obras como Lord Jim e, principalmente, O coração das trevas, que inspirou o filme Apocalipse Now, de Francis Ford Coppola.

“Às vezes, nos esticando à sombra de uma árvore de beira de estrada, observamos os movimentos do trabalhador num campo distante, e após um bom tempo, começamos a perguntar preguiçosamente sobre o que ele faz. Observamos os movimentos de seu corpo, o ondular dos braços, vemo-lo se ajoelhar, levantar-se, hesitar, começar de novo. É preciso aumentar o fascínio de uma hora de preguiça para que se diga o propósito de suas investidas. Se sabemos que está tentando levantar uma pedra, cavar um buraco, arrancar um tronco pela raiz, olhamos com um interesse mais real para seus esforços; estamos dispostos a ignorar o desconforto que nos causa a sua agitação sobre a quietude da paisagem; e mesmo assim, numa disposição fraterna, podemos recorrer à nossa consciência para perdoar o fracasso dele. Captamos seu objetivo, e, afinal de contas, o companheiro tentou, e talvez ele não tivesse força o bastante – e talvez ele não tivesse a técnica necessária. Perdoamos, seguimos nosso caminho – e esquecemos.

Assim também é o trabalho do artista. Longa é a arte, e breve a vida, e o sucesso mora longe. Desse modo, incertos do vigor para irmos além, falamos um pouco do objetivo – o objetivo da arte, que, como a vida em si, é inspiradora, difícil – obscurecido pelas brumas. Não está na lógica clara de uma conclusão triunfante; não está na revelação de um daqueles segredos impiedosos chamados de Leis da Natureza; não é menos grandioso, apenas mais difícil.

Imobilizar, no espaço de um fôlego, as mãos que se ocupam com o trabalho da terra, e exortar homens obstinados pela visão de metas distantes a apreciar por um momento a aparição de forma e cor ao seu redor, de sol e sombra; fazê-los dar uma pausa para um olhar, para um suspiro, para um sorriso – tal é o objetivo, difícil e evanescente, e reservado para apenas alguns poucos alcançarem. Mas, às vezes, por merecimento e sorte, até mesmo essa tarefa é realizada. E quando é realizada – atenção! – toda a verdade da vida está lá: um momento de aparição, um suspiro, um sorriso – e o retorno a um eterno descanso”.


OBS: O trecho acima poderia ser mais lindo, não fosse a tradução capenga feita por mim.

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