quinta-feira, 23 de agosto de 2007

ESCRITOR BRILHANTE E CRÍTICO MORDAZ

No dia 1º de julho de 1998, morria o crítico, biógrafo e poeta britânico Martin Seymour-Smith. Seu último trabalho foi o polêmico e ousado Os 100 Livros Que Mais Influenciaram a Humanidade , lançado no Brasil em 2002 pela Difel, em que o crítico comenta a importância dos autores e obras que, segundo ele, modificaram de algum modo a maneira de sentir e pensar dos homens.

De modo geral, o trabalho de Seymour-Smith sempre foi polêmico, preferindo uma análise marcada pela subjetividade, sem deixar de observar cada centímetro dos fatos que rodeiam seu objeto de estudo. Foi assim ao escrever a biografia do poeta e romancista inglês Thomas Hardy, suscitando fúrias e admiração nos leitores ao redor do mundo. Foi assim também ao ter seu último livro publicado.

Enquanto em Thomas Hardy – A Biography, a polêmica fica por conta das minúcias sobre a vida pessoal do biografado, como tentativa de por abaixo a interpretação de seus biógrafos anteriores, em Os 100 Livros, o grito de protesto vem daqueles que não se conformam com a preterição de seus queridinhos por parte de Seymour-Smith.

Entre os que ficaram de fora da lista do polêmico selecionador, estão Heidegger e Husserl. Mas os motivos da ausência de um e de outro são díspares. O primeiro porque, para Seymour-Smith, era um “charlatão e jurado anti-semita” cuja filosofia encanta muita gente, de maneira incompreensível, mas que não se pode dizer que mudou alguma coisa no paradigma do pensamento humano.

Já Husserl, só não fez parte da lista – com Idéias: Introdução Geral à Fenomenologia Pura – porque “sua influência foi totalmente indireta”. Segundo Seymour-Smith, Husserl só é acessível aos filósofos profissionais. Mas acrescenta: “O existencialismo, porém, não pode ser entendido sem Husserl, um homem decente e honrado, bem diferente de Heidegger, seu aluno traiçoeiro”.

Esse rancor em relação a Heidegger talvez se explique pelo fato de que Seymour-Smith era judeu. E todos sabemos que Heidegger fez parte do staff nazista de Hitler, aliás, o único filósofo entre a trupe imediata do ditador alemão. Isso foi dito inclusive pelo mais famoso e mais completo biógrafo de Hitler, Joachim Fest.

Em todo caso, Seymour-Smith era polêmico com muitas sumidades intelectuais. Sua verve cáustica não se dirige apenas ao filósofo nazista. Em cada página dedicada a uma das obras analisadas, em Os 100 Livros, ele aplica um pouco de sua acidez contra alguém ou alguma coisa.

Sobre o filósofo francês Jacques Derrida, ele diz: “Derrida é tão interessante como um borrão, e somente uma conspiração de mentes inseguras pode dar-lhe alguma importância”. Mas Derrida não está sozinho nessa. Afinal, da própria filosofia francesa atual, Seymour-Smith não deixa pedra sobre pedra: “O Pensamento francês contemporâneo não se distingue nem pelo seu humor nem por sua imediata inteligibilidade. Distingue-se, talvez, isso sim, pela veemência de seu pomposo blá-blá-blá”.

As pinceladas malditas não poupam sequer certos pensadores influentes, da lista que ele mesmo elaborou. B. F. Skinner, por exemplo, que está entre os que mais influenciaram a humanidade com seu livro Para Além da Liberdade e da Dignidade, era, segundo o crítico mordaz, “um excelente cientista experimental, mas, como ser humano, um idiota desesperado para banir de si mesmo qualquer traço de ternura que pudesse possuir”.

Trechos antes dessa avaliação, ele já havia dito que Skinner “pensava saber melhor do que ninguém o que era melhor para os outros”, fazendo com que sua conduta, a de Skinner, diante da vida fosse “mais repreensível, se não totalmente estúpida, do que a de qualquer outro estudioso”.

Ainda de Heidegger: “Hoje sinistramente popular (...), nazista até o fim, anti-semita, oportunista e fraudulento (...), nazista não arrependido (...), maléfico inspirador do corrente niilismo chamado de pós-modernismo”. Com todos esses adjetivos, talvez o mais leve seja mesmo “charlatão”.

De T. S. Eliot, ele diz: “hoje, aos olhos de muita gente, ele não passa de um velho anti-semita e secretamente um fascista, cujos versos não são muito mais do que uma antologia e amálgama do talento de outros homens”.

Mas, a despeito de tudo que foi citado acima, Seymour-Smith era sobretudo honesto com seus leitores, em relação ao que pensava. E elogiou muita gente, quando era o caso de se fazerem apreciações. Num só período de frase, ele aprecia dois grandes filósofos, ao falar de Thomas Hobbes: “nenhum filósofo de qualquer nacionalidade o superou na prosa e somente Schopenhauer se lhe igualou”.

Ao citar Relatividade, por exemplo – livro que Einstein publicou para divulgar sua teoria homônima –, como uma das obras que mais influenciaram a humanidade, Seymour-Smith se sentiu na obrigação de dizer: “Cá entre nós, podemos apenas fingir que entendemos a Teoria da Relatividade de Einstein, mas temos, pelo menos, uma boa desculpa: ela é tão difícil de ser compreendida, tão misteriosa à sua maneira, que levou alguns anos até ser aceita pela maioria dos físicos.”

Da mesma forma, à sua maneira, Martin Seymour-Smith é encantador. Ele nos passa a impressão de que foi um homem conhecedor de todas as coisas, que penetrou todos os mistérios, que leu tudo, que sabia tudo sem ser pernóstico, sem ser, de maneira alguma, enjoativo e pedante. Sua erudição nos mantém o tempo todo acesos ao que ele diz.

Seymour-Smith é sem dúvida um autor prolífico. Entre suas mais de 40 obras, estão os livros de poesia Wilderness e Reminiscenses of Norma. Também escreveu sobre a poesia de Shakespeare e sobre as prostitutas na literatura. Mas, apesar de toda a sua dedicação ao trabalho intelectual e de seus 50 anos – dos 70 que viveu – serem voltados para isso, pouco se sabe sobre sua vida. Na internet não há quase nada sobre ele. Pode-se dizer que Seymour-Smith é mais um exemplo de autores brilhantes lançados no mar da solidão e do esquecimento.

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Veja a lista de Os Cem Livros Que Mais Influenciaram a Humanidade, segundo Seymour-Smith


I Ching

O Velho Testamento

A Ilíada e A Odisséia, de Homero

Os Upanishads

O Caminho e Seu Poder, de Lao-tzu

O Avesta

Analectos, de Confúcio

História da Guerra do Peloponeso, de Tucídedes

Obras, de Hipócrates

Obras, de Aristóteles

História, de Heródoto

A República, de Platão

Elementos de Geometria, de Euclides

O Dhammapada

A Eneida, de Virgílio

Da Natureza da Realidade, de Lucrécio

Exposições Alegóricas das Leis Divinas, de Philo de Alexandria

O Novo Testamento

Vidas Paralelas, de Plutarco

Anais, Da Morte do Divino Augusto, de Cornélio Tácito

O Evangelho da Verdade

Meditações, de Marco Aurélio

Hipotiposes Pirrônicas, de Sexto Empírico

Novenas, de Plotino

Confissões, de Agostinho de Hipo (St Agostinho)

O Corão

Guia Para os Perplexos, de Moisés Maimônides

A Cabala

Suma Teológica, de Tomás de Aquino

A Divina Comédia, de Dante Alighieri

Elogio da Loucura, de Desidério Erasmo (de Roterdã)

O Príncipe, de Maquiavel

Do Cativeiro Babilônico da Igreja, de Martinho Lutero

Gargântua e Pantagruel, de François Rabelais

Institutos da Religião Cristã, de Calvino

Da Revolução das Órbitas Celestiais, de Nicolau Copérnico

Ensaios, de Michel Eyquem de Montaigne

Dom Quixote (primeira e Segunda partes), de Miguel de Cervantes

A Harmonia do Mundo, de Johannes Kepler

Novum Organum, de Francis Bacon

Primeiro Folio, de Shakespeare

Diálogo Sobre os Grandes Sistemas do Universo, de Galileu Galilei

Discurso Sobre o Método, de René Descartes

Leviatã, de Thomas Hobbes

Obras, de Gottfried W. Leibniz

Pensamentos, de Blaise Pascal

Ética, de Baruch Spinoza

O Progresso do Peregrino, de John Bunyan

Princípios Matemáticos da Filosofia Natural, de Isaac Newton

Ensaio Sobre a Compreensão Humana, de John Locke

Os Princípios Sobre o Conhecimento Humano, de George Berkley

A Nova Ciência, de Giambatista Vico

Um Tratado Sobre a Natureza Humana, de David Hume

A Enciclopédia, de Denis Diderot (org.)

Um Dicionário da Língua Inglesa, de Samuel Johnson

Cândido, de François Marie de Voltaire

Senso Comum, de Thomas Paine

Uma Pesquisa Sobre a Natureza Humana e a Causa da Riqueza das Nações, de Adam Smith

Declínio e Queda do Império Romano, de Edward Gibbon

Crítica da Razão Pura, de Immanuel Kant

Confissões, de Jean-Jacques Rousseau

Reflexões Sobre a Revolução na França, de Edmund Burke

Reivindicações dos Direitos da Mulher, de Mary Wollstonecraft

Uma Pesquisa Sobre Justiça Política, de William Godwin

Ensaio Sobre o Princípio da População, de Thomas Robert Malthus

Fenomenologia do Espírito, de George Wilhelm Hegel

O Mundo Como Vontade e Representação, de Arthur Schopenhauer

Curso em Filosofia Positivista, de Auguste Comte

Da Guerra, de Carl Marie von Clausewitz

Ou Isso/Ou Aquilo, de Søren Kierkegaard

O Manifesto Comunista, de Karl Marx e Friedrich Engels

“Desobediência Civil”, de Henry David Thoreau

A Origem das Espécies, de Charles Darwin

Sobre a Liberdade, de John Stuart Mill

Primeiros Princípios, de Herbert Spencer

“Experiências sobre Híbridos das Plantas”, de Gregor Mendel

Guerra e Paz, de Tolstoi

Tratado Sobre Eletricidade e Magnetismo, de James Clerk Maxwell

Assim Falou Zaratustra, de Nietzsche

A Interpretação dos Sonhos, de Freud

Pragmatismo, de William James

Relatividade, de Albert Einstein

Tratado da Sociologia Geral de Vilfredo Pareto

Tipos Psicológicos, de Carl G. Jung

Eu e Tu, de Martin Buber

O Processo, de Franz Kafka

A Lógica da Descoberta Científica, de Karl Popper

Teoria Geral do Emprego, Lucro e Dinheiro, de John Maynard Keynes

O Ser e o Nada, de Jean-Paul Sartre

O Caminho para a Servidão, de Friedrich von Hayek

O Segundo Sexo, de Simone de Beauvoir

Cibernética, de Norbert Wiener

1984, de George Orwell

Histórias de Belzebu para Seu Neto, de Ivanovitch Gurdjieff

Investigações Filosóficas, de Ludwig Wittgenstein

Estruturas Sintáticas, de Noam Chomsky

A Estrutura das Revoluções Científicas, de Thomas S. Khun

A Mística Feminina, de Betty Friedan

Citações do Comandante Mao Tse-tung, de Mao Tse-tung

Além da Liberdade e da Dignidade, de B. F. Skinner

2 comentários:

Anônimo disse...

Estou lendo agora esse expeço livro de mais de 600 páginas que não me surpreendeu muito, porque já tenho leitura sobre os livros citados. Mas não posso deixar de dizer que encontrei informações novas. Muito boa a sua iniciativa de citar o livro e seu autor!
Até mais.

Gilberto G. Pereira disse...

A lista de Syemour-Smith é uma boa carga de leituras. Você, e qualquer pessoa que as tem, merece os parabéns, por se tratar de um conjunto de leituras invulgar. E fico contente que você tenha deixado o comentário aqui. Se voltar de novo, saiba que agradeço.
Abç!