quinta-feira, 24 de julho de 2008

ESPEJOS. UNA HISTORIA CASI UNIVERSAL: o novo livro de Eduardo Galeano

Eduardo Galeano (1940 - ):

O livro que o escritor uruguaio Eduardo Galeano lançou em abril, Espejos. Una historia casi universal, tem trechos publicados no jornal Le Monde Diplomatique Brasil.

Ainda inédito em português, o livro traz um mosaico de textos sobre “arte, desigualdade, feminismo, mídia, impérios e resistências.” Os trechos, traduzidos para o português pelo Le Monde, foram “cedidos e escolhidos pelo próprio autor”, segundo o periódico.

Leia alguns deles:

Fundação da beleza

Estão ali, pintadas nas paredes e nos tetos das cavernas.

Estas figuras, bisões, alces, ursos, cavalos, águias, mulheres, homens, não têm idade. Nasceram há milhares e milhares de anos, mas nascem de novo a cada vez que alguém as olha.

Como eles conseguiram, nossos remotos avós, pintar de maneira tão delicada? Como eles conseguiram, esses brutos que de mão limpa lutavam contra as feras, criar figuras tão cheias de graça? Como eles conseguiram desenhar essas linhas voadoras que escapam da rocha e se vão para o ar? Como eles conseguiram …?

Ou seriam elas?”

...

Fundação literária do cão

Argos foi o nome de um gigante de cem olhos e de uma cidade grega há quatro mil anos.

Também se chamava Argos o único que reconheceu Odisseu, quando chegou, disfarçado, a Ítaca.

Homero nos contou que Odisseu regressou, ao final de muita guerra e muito mar, e se aproximou de sua casa fazendo-se passar por um mendigo enfermiço e andrajoso.

Ninguém se deu conta de que ele era ele.

Ninguém, salvo um amigo que não sabia mais latir, nem podia caminhar, nem sequer se mover. Argos jazia, às portas de um galpão, abandonado, crivado pelos carrapatos, esperando a morte.

Quando viu, ou talvez farejou, que aquele mendigo se aproximava, levantou a cabeça e abanou o rabo.”

...

Fundação da linguagem

Em 1870, ao final de uma guerra de cinco anos, o Paraguai foi aniquilado em nome da liberdade de comércio.

Nas ruínas do Paraguai, sobreviveu o primeiro: entre tanta morte, sobreviveu o nascimento.

Sobreviveu a língua original, a língua guarani, e com ela a certeza de que a palavra é sagrada.

A mais antiga das tradições conta que nesta terra cantou a cigarra carmim e cantou o gafanhoto verde e cantou a perdiz e então cantou o cedro: da alma do cedro ressoou o canto que na língua guarani chamou os primeiros paraguaios.

Eles não existiam.

Nasceram da palavra que os nomeou.”


Leia também:

Entrevista com Eduardo Galeano, no site da Carta Maior.

OBS: Para quem gosta da literatura de Galeano, o livro já saiu em português, pela L&PM.

Serviço

Título: Espelho - uma história quase universal
Autor: Eduardo Galeano
Editora: L&PM, 2008, 376 páginas
Preço: R$ 42,00

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