Na Zona da Mata pernambucana, mais precisamente às margens do rio Una, quase na divisa com Alagoas, foi ambientado um romance já meio esquecido pelos leitores de hoje. Sua trama narra a saga de uma família em meio aos conflitos de terra e à chegada do progresso. O livro se chama Os caminhos da solidão. Seu autor, Hermilo Borba Filho (1917-1976).
Publicado em 1957, o romance traz uma narrativa recuada no tempo, cuja história se passa entre os últimos 20 anos do século XIX e os primeiros do XX. O cerne da trama é a conduta de André, sujeito muito estranho. Ele chega àquela região como fugitivo de um crime cometido alhures.
Às margens do Una, André é abordado por um dos jagunços do dono das terras (coronel Albuquerque) em que ele se encontra. André não vê outra alternativa senão matar o tal jagunço – cometendo assim outro crime – e enterrá-lo ali mesmo. Ali mesmo, sobre o túmulo da vítima, ele constrói uma cabana, onde passa a morar.
A partir daí, os caminhos da solidão são apresentados, à medida que também se apresentam os personagens. Cada um vive dentro de seu próprio calabouço, com seus fantasmas e agruras. Cada um com sua história de solidão paralelamente ao desfeche da trama.
De um lado do rio há o coronel Albuquerque, que lamenta não ter filho homem e amargar três filhas solteironas. De outro, há um padre querendo trazer o progresso para aquelas bandas, enquanto fala em nome dos índios, quase dizimados por completo, solitários e esquecidos, cujo único amparo era o do padre.
André se torna jagunço do coronel Albuquerque, depois genro, depois herdeiro de tudo, enquanto a solidão carcome sua alma, por tudo que vive, por tudo que sente, entre a mulher (Rosa) e a amante (Adélia), enterrado nos conflitos com tudo e com todos.
A obra inteira é perpassada por uma espécie de fluxo de consciência, intercalado pela narrativa, para enfatizar esse caráter de pessoas solitárias que – só – se sentem acompanhadas com sua própria subjetividade, suas próprias ruminações.
O estilo de narrar do Borba Filho é límpido e direto. É um belo romance, que lembra um pouco Cem Anos de Solidão, de García Márquez, sem o realismo fantástico, é claro, e sem as tergiversações, mas com todos os ingredientes apresentados na história da criação de Macondo.
Há um quê de tragédia na Macondo de Borba Filho, como há na de Márquez. A tese é de que todos os caminhos da solidão levam ao ocaso. Como se os rios fossem esses caminhos, e o mar a morte.
Trecho:
“Os dias passaram. Como nuvens no céu, como as águas da chuva. Morreu gente, nasceu gente e Adélia contou, devagar, todos aqueles dias, todas aquelas coisas acabando para ela, com exceção das visitas da filha que morava na cidade, do outro lado do rio.
Ficava sozinha no alpendre da casa e aprendeu a conhecer a campina defronte, com as campânulas abertas pela manhã, brilhando com o orvalho, e os sapos coaxando de noite, num ritmo sempre igual. Esperava a tarde para olhar a estrela grande na linha do horizonte. Tudo era igual. Uma visita de longe em longe de André, sem palavras. Tudo o mais acabou.
Publicado em 1957, o romance traz uma narrativa recuada no tempo, cuja história se passa entre os últimos 20 anos do século XIX e os primeiros do XX. O cerne da trama é a conduta de André, sujeito muito estranho. Ele chega àquela região como fugitivo de um crime cometido alhures.
Às margens do Una, André é abordado por um dos jagunços do dono das terras (coronel Albuquerque) em que ele se encontra. André não vê outra alternativa senão matar o tal jagunço – cometendo assim outro crime – e enterrá-lo ali mesmo. Ali mesmo, sobre o túmulo da vítima, ele constrói uma cabana, onde passa a morar.
A partir daí, os caminhos da solidão são apresentados, à medida que também se apresentam os personagens. Cada um vive dentro de seu próprio calabouço, com seus fantasmas e agruras. Cada um com sua história de solidão paralelamente ao desfeche da trama.
De um lado do rio há o coronel Albuquerque, que lamenta não ter filho homem e amargar três filhas solteironas. De outro, há um padre querendo trazer o progresso para aquelas bandas, enquanto fala em nome dos índios, quase dizimados por completo, solitários e esquecidos, cujo único amparo era o do padre.
André se torna jagunço do coronel Albuquerque, depois genro, depois herdeiro de tudo, enquanto a solidão carcome sua alma, por tudo que vive, por tudo que sente, entre a mulher (Rosa) e a amante (Adélia), enterrado nos conflitos com tudo e com todos.
A obra inteira é perpassada por uma espécie de fluxo de consciência, intercalado pela narrativa, para enfatizar esse caráter de pessoas solitárias que – só – se sentem acompanhadas com sua própria subjetividade, suas próprias ruminações.
O estilo de narrar do Borba Filho é límpido e direto. É um belo romance, que lembra um pouco Cem Anos de Solidão, de García Márquez, sem o realismo fantástico, é claro, e sem as tergiversações, mas com todos os ingredientes apresentados na história da criação de Macondo.
Há um quê de tragédia na Macondo de Borba Filho, como há na de Márquez. A tese é de que todos os caminhos da solidão levam ao ocaso. Como se os rios fossem esses caminhos, e o mar a morte.
Trecho:
“Os dias passaram. Como nuvens no céu, como as águas da chuva. Morreu gente, nasceu gente e Adélia contou, devagar, todos aqueles dias, todas aquelas coisas acabando para ela, com exceção das visitas da filha que morava na cidade, do outro lado do rio.
Ficava sozinha no alpendre da casa e aprendeu a conhecer a campina defronte, com as campânulas abertas pela manhã, brilhando com o orvalho, e os sapos coaxando de noite, num ritmo sempre igual. Esperava a tarde para olhar a estrela grande na linha do horizonte. Tudo era igual. Uma visita de longe em longe de André, sem palavras. Tudo o mais acabou.
Tudo era passado e o presente se arrastava como uma lesma na parede lisa. Os dias se foram, se amontoaram, formaram uma semana, meses, um ano, dois, três, vários. Os dias se foram”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário