James Wood, crítico literário: “Graças ao estilo
indireto livre, vemos coisas através dos olhos e da linguagem do personagem, mas também através dos olhos e da linguagem do autor” |
James Wood é um crítico literário inglês que escreve na revista The
New Yorker e dá aulas na prestigiosa Universidade de Harvard, nos EUA. Já
publicou vários livros. O mais recente foi A coisa mais próxima da vida,
trecho de um ensaio de George Eliot sobre realismo, em que ela diz: “A arte é a
coisa mais próxima da vida; é um modo de aumentar a experiência e ampliar nosso
contato com os semelhantes para além de nosso destino pessoal.”
Mas um de seus livros mais interessantes é Como funciona a ficção,
publicado no Brasil pela finada CosacNaify, em 2008, há exatamente dez anos.
Neste ótimo livro de 232 páginas, Wood é interessante em tudo que diz.
Ele diz, por exemplo, que os detalhes são importantes na literatura
porque são eles que trazem a marca do extraordinário das coisas ditas. “A
literatura é diferente da vida. A literatura nos ensina a notar melhor a vida”,
diz ele. “Praticamos isso na vida, o que nos faz, por sua vez, ler melhor o
detalhe na literatura, o que, por sua vez, nos faz ler melhor a vida”,
completa.
Diz que o ritmo é uma espécie de afinação da alma, e toda leitura deve
ser feita pelo terceiro ouvido, um sentido que não existe na natureza e que
precisa ser desenvolvido.
“Temos de ler musicalmente, testando a precisão e o ritmo da frase,
ouvindo o ruído quase inaudível de associações históricas que se prendem à
margem das palavras modernas (...), decidindo por que uma metáfora é boa e
outra não, avaliando de que forma a colocação perfeita do verbo ou do adjetivo
confere à frase um caráter matematicamente definitivo”, ensina o autor. Obviamente,
as últimas palavras fazem parte do aprendizado com a leitura de Gustave
Flaubert, considerado o pai do romance moderno.
Ironia
Para Wood, o estilo indireto livre confere uma ambiguidade mais difusa. “Graças
ao estilo indireto livre, vemos coisas através dos olhos e da linguagem do
personagem, mas também através dos olhos e da linguagem do autor.”
Ele cita como mestres desse estilo os autores modernos, de Charles
Dickens, Tchekhov, Henry James e Jane Austen a James Joyce, William Faulkner, V.
S. Naipaul e David Foster Wallace. Este último é autor de um romance magnífico
intitulado Graça infinita, em que o autor demonstra ser “muito bom em
encarnar a plenitude do tédio”.
O que o estilo indireto livre traz de novo à modernidade é o caráter
imprescindível da ironia. “Sob tal luz, não há quase nenhuma área da narração
que não seja alcançada pelo longo dedo do estilo indireto livre – ou seja, pela
ironia”, diz Wood.
Como funciona a
ficção é um livro instigante, realizado para revelar ao
leitor os elementos essenciais da narrativa e o modo como são operados dentro
do texto. E não deixa de ser um elogio a Flaubert. Wood diz que “os romancistas
deveriam agradecer a Flaubert como os poetas agradecem à primavera.”
(Gilberto G. Pereira. Publicado originalmente em 4 de março, no Jornal
Opção, de Goiânia)
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