Em reportagem da Folha de S. Paulo deste sábado sobre a reabertura da Biblioteca Mário de Andrade, os executivos públicos dão um show de despreparo e arrogância. Primeiro o secretário municipal de Cultura, Carlos Augusto Calil, fala sobre a permanência das grades em torno do prédio, que deveriam ser retiradas, de acordo com novo projeto. Ele afirma que a cerca não resolve o problema da segurança. “O problema”, diz ele, “é não expor demais o edifício a todo tipo de invasão.”
Perguntado se a invasão viria por parte dos mendigos, ele se recusa a dizer que tipo de invasores seria. É evasivo: “Todo tipo de gente para pra descansar, tem todo tipo de uso.” Que tipo de gente? Que tipo de uso? Ele não tem autoridade para falar sobre aquilo que deveria conhecer e saber quais são os problemas? Não fala por que não quer? Não fala por que não quer se comprometer?
Depois, a diretora da biblioteca, Maria Christina Barbosa de Almeida, fala sobre as grades terem ficado mais baixas (embora não tenham sido retiradas totalmente). “Rezemos para que essas grades mais baixas resolvam o problema em relação aos nossos vizinhos.”
Ela se referia aos moradores da praça, sem-tetos que ficam por ali, usam o banheiro da biblioteca, e eles (órgão público) não sabem o que fazer, tendo como medida as barreiras físicas, jamais nenhuma medida de inclusão. No final, diz a diretora à reportagem: “Não vai escrever que eu não gosto de pobre, que você vai ver.”
A digníssima diretora da Biblioteca Mário de Andrade, Maria Christina Barbosa de Almeida, afirma que não gosta de pobre e descaradamente ainda pede para o repórter não colocar essa particularidade de seu discurso na matéria. O mais absurdo disso tudo é que ela fala de “vizinhos da biblioteca” se referindo aos mendigos e depois diz que não gosta de pobre, como se mendigo fosse pobre.
Maria Christina Barbosa de Almeida ou é completamente alienada da realidade social, mais do que isso, ignorante completa dos elementos sociológicos que fazem parte de uma realidade social, ou é cínica ao extremo. Isso porque ao aproximar a ideia de pobre com mendigo ela (além do fato de não gostar de pobre [e de mendigos), ela está inferindo que se o sujeito ganha um salário mínimo, tem uma família, um lugar para morar é como um mendigo.
Do mesmo modo, se um sujeito está na miséria total, na maior das desgraças a que ‘um destino humano’ pode lhe jogar, sem casa, sem família, sem dinheiro, sem perspectiva, sem lugar para sequer fazer suas necessidades fisiológicas (e não adianta alguém vir dizer que seria só procurar um trabalho e se reerguer, que isso é mentira, muitas vezes a pessoa não quer, mas outras tantas, as portas não se abrem de jeito nenhum, por causa de gente com esta diretora), se o sujeito se encontra nesta situação é apenas “gente pobre”.
É bom que todos eles saibam que as principais ameaças à biblioteca não vêm dessas pessoas que moram nas ruas. Não foram elas que roubaram as obras raras em 2005. Além disso, pobre, como categoria social, não oferece ameaça a ninguém, pelo menos não mais que os ricos, que a classe média, que qualquer grupo. Ou seja, foi uma grande bobagem ter dito aquilo. Mais, é uma bobagem incomensurável pensar dessa maneira.
Perguntado se a invasão viria por parte dos mendigos, ele se recusa a dizer que tipo de invasores seria. É evasivo: “Todo tipo de gente para pra descansar, tem todo tipo de uso.” Que tipo de gente? Que tipo de uso? Ele não tem autoridade para falar sobre aquilo que deveria conhecer e saber quais são os problemas? Não fala por que não quer? Não fala por que não quer se comprometer?
Depois, a diretora da biblioteca, Maria Christina Barbosa de Almeida, fala sobre as grades terem ficado mais baixas (embora não tenham sido retiradas totalmente). “Rezemos para que essas grades mais baixas resolvam o problema em relação aos nossos vizinhos.”
Ela se referia aos moradores da praça, sem-tetos que ficam por ali, usam o banheiro da biblioteca, e eles (órgão público) não sabem o que fazer, tendo como medida as barreiras físicas, jamais nenhuma medida de inclusão. No final, diz a diretora à reportagem: “Não vai escrever que eu não gosto de pobre, que você vai ver.”
A digníssima diretora da Biblioteca Mário de Andrade, Maria Christina Barbosa de Almeida, afirma que não gosta de pobre e descaradamente ainda pede para o repórter não colocar essa particularidade de seu discurso na matéria. O mais absurdo disso tudo é que ela fala de “vizinhos da biblioteca” se referindo aos mendigos e depois diz que não gosta de pobre, como se mendigo fosse pobre.
Maria Christina Barbosa de Almeida ou é completamente alienada da realidade social, mais do que isso, ignorante completa dos elementos sociológicos que fazem parte de uma realidade social, ou é cínica ao extremo. Isso porque ao aproximar a ideia de pobre com mendigo ela (além do fato de não gostar de pobre [e de mendigos), ela está inferindo que se o sujeito ganha um salário mínimo, tem uma família, um lugar para morar é como um mendigo.
Do mesmo modo, se um sujeito está na miséria total, na maior das desgraças a que ‘um destino humano’ pode lhe jogar, sem casa, sem família, sem dinheiro, sem perspectiva, sem lugar para sequer fazer suas necessidades fisiológicas (e não adianta alguém vir dizer que seria só procurar um trabalho e se reerguer, que isso é mentira, muitas vezes a pessoa não quer, mas outras tantas, as portas não se abrem de jeito nenhum, por causa de gente com esta diretora), se o sujeito se encontra nesta situação é apenas “gente pobre”.
É bom que todos eles saibam que as principais ameaças à biblioteca não vêm dessas pessoas que moram nas ruas. Não foram elas que roubaram as obras raras em 2005. Além disso, pobre, como categoria social, não oferece ameaça a ninguém, pelo menos não mais que os ricos, que a classe média, que qualquer grupo. Ou seja, foi uma grande bobagem ter dito aquilo. Mais, é uma bobagem incomensurável pensar dessa maneira.
Estamos bem de representantes do poder público. Sinto um alívio em saber que nem todos são assim.
7 comentários:
Dileto Gilberto:
O mais estranho não é o discurso bestunto da referida diretora da Biblioteca Mário de Andrade, pois quando o discurso é proferido por indíviduos ligados ao nosso (sim, nosso, infelizmente temos que admitir o "nosso") poder público, podemos esperar barbaridades e outras asnidades que repercutem em ignomínias irreversíveis. Você, num texto belíssimo, narrou apenas um fato. Ao ler (esqueci de dizer: encontrei o teu blog através de outro link no blog Bóis Brésil do meu amigo Antoine), lembrei-me de outros discursos e ações que medraram de indivíduos engalanados com títulos no "nosso" poder público, como por exemplo: os bestuntos ocupantes de cargos importantes na catacumbas sombrias do CNE (Conselho Nacional da Educação), os quais, utilizando discusos com slogans ignavos, expobraram um clássico do Monteiro Lobato. Depois tentaram explicar essa tremenda jericada. Outro fato, já mais distante, o Prefeito de São Paulo, "kassando" apoio da tucanada, inverte a utilização da Vila Fortunata, antiga propriedade do mecenas da Semana de Arte Moderna, René Thiollier - e o pior, denomina o espaço com o nome do falecido gonernador de São Paulo, Dr. Mario Covas (como se isso fosse importante para os familiares do falecido e para o povo paulistano). Quando questionado, escapuliu das explicações. Dizem e negam ter dito. Explicam invertendo o contexto, etc...
Esses procedimentos e outros similares já receberam a alcunha de "tiriricagem". Eles realmente tiriricam. É... Infelizmente nos fazem rir... Mas deveríamos chorar.
Dileto Amigo: o que não podemos é ficar calados. Então, deixo aqui cravado minhas congratulações pelo excelente artigo.
Abraços e:
"ESTEJA E SEJA E FIQUE FELIZ!"
Luiz de Almeida
Blog Retalhos do Modernismo
http://literalmeida.blogspot.com
Obrigado, Luiz! Só lembrando que, em 2005, se não me engano, Kassab humilhou um cidadão que protestou contra ele. Kassab gritou loucamente no ouvido do homem, que nada podia fazer a uma autoridade armada de seguranças: "VAGABUNDO, VAGABUNDO, VAGABUNDO"; e depois, invertendo a ordem dos fatos, arbitrariamente, como fazem os déspotas, disse que não processaria o cidadão.
Gente, trabalho com a Profa. Dra. Maria Christina Barbosa de Almeida que, inclusive, já fez vários trabalhos em Bibliotecas comunitárias. Muitos colegas estavam ao lado dela na hora da entrevista e ela NÃO FALOU ISTO!
Outras tantas declarações positivas não são publicadas - qual o interesse nisto?!
Elisangela Alves Silva
Bibliotecária, SP
Biblioteca Mário de Andrade
Não sei se ela disse isso de verdade ou não, mas gostei muito do seu texto ... e do blog!
Obrigado, Wedis! A colega acima (Elisângela, que estudou na USP) perguntou que interesse há nisso. Não sei a que 'isso' ela se refere, mas digo que nem sempre escrevemos por interesse, às vezes apenas por indignação, né. Um abraço!
Giba,
Se eu te encontrar na rua e te disser:
_Nao escreve no seu blog que eu nao gosto dele.
Eu tou dizendo que eu nao gosto do seu blog? Que outras interpretaçoes pode-se fazer do que eu disse?
Na boa, alienaçao também é nao conseguir identificar contra quem lutar. Poucas pessoas trabalharam tanto pela "inclusao" quanto a diretora.
Entre aspas porque você só inclui aquilo que você acha que está fora. Foi em uma convençao organizada pela diretora que aprendi a diferença entre inclusao e reconhecimento. Ia ter sido legal ter encontrado você lá. Você ia, como eu, torcer pra professora assumir a direçao da Mário, ou de qualquer outra grande biblioteca.
Aceito seu primeiro argumento, dOliveira. Embora eu não consiga identificar quem é você, porque sua assinatura está incógnita, não leva a nenhum blog, não tem nome, enfim. Quanto à frase "alienação também é não conseguir identificar com quem lutar" não se sustenta para defender a diretora porque não é só isso, alienação é também estar alheio a outras formas de ver o mundo. É preciso ter sensibilidade para entender a pobreza, e não só os livros, e saber que quando se faz, ou fala, uma brincadeira sobre quem não pode se defender fica muito fácil. É bem mais difícil entender que ser pobre não é ser mendigo. Estes, por terem dificuldades de acesso a qualquer coisa, não pedem sequer inclusão, aliás, não pedem nada, mas ainda assim, eles têm o direito de ter acesso ao uso de um banheiro público. Nem querem ler um livro, porque a dor da fome é maior sempre que a dor da alma. Só querem usar o banheiro, só isso. Fui contra a piadinha "não diga que sou contra pobre", que não era para ser publicada, e o repórter, que só fez a sua parte, publicou. Ou seja, pobre, mendigo e morador de rua para ela não têm diferença alguma. É inadmissível posturas como essa, em qualquer esfera pública. Já basta o discurso eugênico de alguns abastados.
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