quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

BIOGRAFIA MÍNIMA: Os sapatos de Orfeu, a vida de Carlos Drummond de Andrade

José Maria Cançado, respeitado jornalista e escritor que morreu em 2006, foi o autor da biografia de Carlos Drummond de Andrade, Os Sapatos de orfeu, de 1993. Li esse livro em 2003 e, no decorrer da leitura, fiz algumas anotações.

Agora, por falta de tempo, talvez, mas, principalmente, por estar distante da época da leitura que fiz, repasso as anotações sobre o livro, que não deixam de retratar, pela superfície, claro, a vida do poeta mineiro.

Primeiros anos

Os sapatos de Orfeu, biografia de Carlos Drummond de Andrade (1902 – 1987), Carlito.

Natural de Itabira, Minas Gerais. Filho de Julieta Augusta Drummond e Carlos de Paula Andrade.

Drummond tinha uma relação tacitamente conflituosa com o pai, a quem via e tinha como homem áspero no trato com os filhos. A mãe era toda doçura.

O próprio Drummond virou mito, em relação à sua suposta aspereza e da falta de calor humano, por ser tímido e reservado.

Aos 13 anos de idade entra para o Grêmio Dramático e Literário Arthur Azevedo. Na sua adolescência, Carlito, como era chamado, foi simpatizante dos alemães. Torcia para eles na Primeira Guerra Mundial.

Aos 16 anos, foi estudar em Friburgo, Rio de Janeiro, no Colégio Anchieta. Em 1919, aos 17 anos, foi expulso do Colégio Anchieta por “‘insubordinação mental’”. Logo depois de voltar para Itabira, se muda para Belo Horizonte, com a família. Decisão brusca do pai, que ficou sem explicação.

Amizades e amores

Em 1922, Drummond conhece Pedro Nava. Formaram uma turma que se encontrava no Bar Estrela. Faziam parte dessa turma Alberto Campos (um dos mais cultos do grupo, segundo Cançado, mas morreu cedo, aos 28 anos de idade), Emílio Moura, Arilton Campos, Rodrigo Mello Franco de Andrade e Eduardo Frieiro.

Na Rua da Bahia, “ficavam os outros dois pontos que completavam a constelação do Estrela – a Livraria Alves e o Cine Odeon. Na Livraria Alves eles iam todas as tardes para filar a leitura de alguns livros (...) e para socializar as ideias e as experiências.”

Os amigos eram poucos, por sua própria determinação, mas intensos. A tríade mais representativa se fazia com as correspondências entre Mário de Andrade, Drummond e Manuel Bandeira.

Nessa mesma época, mas fora da turma, Drummond conheceu Dolores de Morais, que viria a ser sua mulher.

Uma coisa interessante sobre a vida particular de Drummond. Ele era namorador, segundo Cançado. Teve inúmeros casos de amor. Fato no mínimo exótico para uma pessoa tímida e arredia como Drummond. Entre suas amantes estavam Célia Neves (que mais tarde se casaria com Poty Lazzarotto), Eneida de Morais e Lygia Fernandes, para ficar no registro.

Da timidez de Drummond e sua domesticidade

Drummond era mesmo muito reservado em relação à sua vida particular. Ao enviar o convite de casamento aos colegas, depois de quatro anos de namoro, todos ficaram surpresos, porque sequer sabiam que ele tinha namorada. Estilo mais ‘mineirinho’ do que este não deve existir.

Segundo Cançado, “(...) defendia sua domesticidade com uma tenacidade que beirava à violência contra si mesmo, o que fazia com que ele tomasse uma simples visita pela mais ameaçadora das perseguições.”

Paternidade

Em 1928, nasce Maria Julieta, sua única filha. Neste mesmo ano é publicado pela primeira vez o poema No meio do caminho tinha uma pedra, na Revista Antropofagia.

Articulações

Em 1930, Carlos Drummond estava com os revolucionários, em Minas gerais, que ajudaram a pôr Getúlio Vargas no poder. Foi por isso que, em 1934, Gustavo Capanema, o novo ministro da Educação e Saúde, convidou Drummond para ser seu chefe de Gabinete, no Rio de Janeiro.

Mesmo assim, Drummond não se achava no Paraíso com a proposta, ainda que ela poderia tirá-lo das dificuldades financeiras em que se encontrava. Na época, aos 32 anos, ele escreveu: “‘Sem nenhum problema resolvido, sequer colocado.’” Mas aceitou a proposta, depois dos argumentos de seu amigo Cyro dos Anjos. Foi morar no Rio de Janeiro como funcionário do Governo.

“Drummond com certeza não era ‘intransigente defensor’ de grupo nenhum. Mas tinha, sem dúvida, uma intransigente antipatia pela pregação anticomunista de Alceu Amoroso Lima [fervoroso líder católico, anticomunista, um dos mais respeitados intelectuais do país, na época, que escrevia sob o pseudônimo de Tristão de Athayde].”

Chegou a pedir demissão de seu cargo – mas não foi aceito por Gustavo Capanema – por causa da influência de Amoroso Lima no Governo de Vargas.

Drummond era um exemplo de profissional aplicado no serviço público. "Capanema nunca deixou de dar mão forte a Drummond. Além da amizade pelo autor de Alguma Poesia, ele tinha motivos para isso: Drummond era um monstro de correção e rigor burocrático, tornando-se responsável por quase toda a condução administrativa do Ministério, (...)."

Política

Drummond milita no Partido Comunista pelo jornal Tribuna da Tarde. Mas não por muito tempo. O controle excessivo do jornal e do Partido não o deixou continuar. Essa militância foi de 23 de maio a 30 de outubro de 1946.

Por causa dessa determinação de Drummond, de sair, o Partido o execrou, e até Pablo Neruda, que havia feito questão de sair nas fotos com ele, quando passou uma semana no Brasil, em 1945, disse, depois, que “‘a América tinha dois traidores: Gonzáles Videla [o então presidente do Chile] e Carlos Drummond de Andrade.’”

O jornalista Oswaldo Peralva chegou a dizer que Drummond havia se vendido à Embaixada americana. Depois se retratou num romance chamado O retrato. Veja a que tipo de baixeza determinada categoria de jornalistas pode chegar.

Antes da queda de Getúlio, com Luís Carlos Prestes ainda preso, Drummond, juntamente com Célia Alves e Oswaldo Alves, entrevistara o líder comunista na cadeia, no dia 15 de outubro de 1945. Encontro marcado em função da admiração de Drummond à lógica de Prestes, mas sem se deixar entregar a ela.

Relações

Drummond conhece João Cabral de Mello Neto, em 1940, quando este tinha 20 anos de idade.

Drummond também era leitor de Kierkegaard, “que ele leu até os dias finais de sua vida.”

A Drummond não agradavam os concretistas, ou melhor, o movimento não lhe agradou. Achava um troço meio pobre. Nem Drummond aos concretistas, criticando-o quando podiam.

Mário Faustino (promissor poeta piauiense que morreu jovem, aos 32 anos, num acidente de avião, nos Andes, em 1962) espinafra Drummond, em sua coluna, no Jornal do Brasil, em 1957.

Literatura e erotismo

Drummond também conhecia bem os meandros do erotismo na literatura. Chegou a fazer lista bibliográfica, além de poemas, é claro, sobre o assunto para uma amiga. Entre esses poemas estão os que foram publicados postumamente, em 1992, no livro O amor natural.

Notinhas

José, seu irmão, jamais o perdoou “por ter carregado um pouco da sua vida para dentro do poema famoso – José.”

José Maria Cançado escreve um parágrafo muito bom sobre os escritores na velhice (ver página 315).

Na década de 1970, Drummond faz amizade com José Mindlin.

Em 5 de agosto de 1987, Maria Julieta morre de câncer.

No dia 17 de agosto de 1987, às 20h45, morre Carlos Drummond de Andrade.

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