Foto: Wikipedia
Tóquio, capital japonesa,
é a maior megacidade do mundo, com 35,7 milhões de pessoas
Estamos
caminhando para o consumo total de duas décadas do século XXI. E o que foi
vivido nesse período já é amostra suficiente das tendências globais. Todas elas
tangenciam de alguma forma a vida nas grandes cidades. A era do campo, pelo
menos como hegemonia populacional, chegou ao fim. E não se trata de boa notícia,
afinal, quem vai produzir alimentos?
Em termos
proporcionais, desde 2008, a população urbana do mundo é maior do que a rural.
Dois continentes gigantes ainda são essencialmente rurais, a África e a Ásia,
mas já estão se despertando para a vida na cidade. Ano após ano, sua população
migra vertiginosamente para morar em ambientes insalubres e dormir em quartos
apertados em metrópoles como Xangai, na China, que atualmente conta com 23 milhões
de habitantes.
Para se ter
uma ideia, daqui a dez anos, a Organização das Nações Unidas (ONU) prevê a
entrada de mais nove megacidades no hall das que possuem mais de dez milhões de
habitantes. Das novatas, duas virão da África e seis da Ásia (quase todas da
China).
Segundo a
ONU, em 2025, a cidade de Lagos, na Nigéria, terá 15,8 milhões de habitantes, e
ela nem figura entre as megalópoles de hoje. Na África, até agora, só Cairo, no
Egito, faz parte do hall das megacidades (quase 12 milhões de pessoas). Embora
os centros urbanos asiáticos tenham também bolsões de pobreza, nada se compara
aos desafios que a africana Lagos terá de enfrentar para melhorar a qualidade
de vida de seus cidadãos.
No Brasil,
apenas duas megalópoles se desenham no corpo daquelas que ultrapassaram a casa
dos dez milhões de pessoas: São Paulo e Rio de Janeiro. A rigor, apenas a
capital paulista tem em seu município um volume demográfico atingindo a
primeira dezena de milhões. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística, em 2016, o município de São Paulo contava com 12 milhões de
habitantes. Já o Rio de Janeiro aparece com 6,5 milhões.
Mas as duas metrópoles,
que hoje já podem ser chamadas de megalópoles, são vistas pela emenda de uma
cidade na outra, contando a partir da principal, colocando-as no salão dos
maiores conglomerados do mundo.
Caminhos de
leitura
Partindo
desse ponto de vista, das 19 cidades com este perfil atualmente, Tóquio, a
capital japonesa, é a maior delas, com 35,7 milhões de pessoas. Para apontar
perspectivas e descobrir qual é o futuro dessas cidades, que, no fundo,
significa indicar caminhos de leitura sobre a humanidade inteira, o geógrafo
norte-americano Laurence C. Smith realizou uma série de estudos no hemisfério
norte do planeta.
Ele
perambulou por lugares inóspitos como o Alasca, sentindo o efeito das mudanças
climáticas, e se jogou à multidão de consumidores em efervescências como Nova
York. O resultado de sua pesquisa é o livro O mundo em 2050: como a demografia, a demanda de recursos naturais, a
globalização, a mudança climática e a tecnologia moldarão o futuro (Campus,
2011, 276 páginas, tradução de Ana Beatriz Rodrigues).
O livro de
Smith tem uma importância fundamental para os que procuram entender a dinâmica
das cidades. No cerne do seu trabalho está a constatação da dupla face do
capitalismo, o agente da ascensão da humanidade a uma vida de conforto, pelo
menos boa parte dela.
E é aí que
entra o lado negro do sistema. Se por um lado, o capitalismo joga luz e aquece
a alma de quem consegue ficar a favor de seus ventos, por outro, ele e sua
sociedade de consumo são agentes – e serão cada vez mais – da queda brutal
dessa mesma espécie. Isso porque, o que se nota, segundo Smith, é uma crescente
indução ao consumo, criando um estilo de vida insustentável.
Veremos a
predação dos recursos minerais, a demanda sem fundo de alimentos e a
sofisticação tecnológica que exige da natureza cada vez mais a extração de
minérios como aço, ferro e prata. Além disso, o uso da água, o bem mais
precioso do planeta, será crescentemente mais agressivo.
Forças
globais
Para
entender como as tendências apontam para um futuro próximo – não mais de
quarenta anos – cheio de desafios e
necessidade de readaptações, Smith levou em conta quatro forças globais nesse
processo de transformação, que inclusive já vêm indicadas no subtítulo de seu
libro: a demografia, a crescente demanda sobre os recursos naturais, a
globalização e a mudança climática.
Todas as
forças convergem para a vida urbana, já que o mundo na terra acaba de deixar o
campo um pouco mais solitário e devagar. Por isso mesmo, o crescimento das
cidades – e o que fazer para a vida se manter num quadro aceitável – é a
discussão mais interessante do livro de Smith.
Ao longo da
publicação, o autor enumera uma série de razões para nos preocuparmos com o
futuro do planeta. Mas sempre encontra um meio de mostrar que ainda há um
norte. Segundo Smith, o grande mal hoje em dia é o estilo de vida adquirido
pelas sociedades de consumo.
As cidades
crescem em função de pessoas que migram do campo em busca de empregos. Mas não
é só isso. A dinâmica demográfica demonstra realmente que “a motivação da
migração da população rural para as cidades é a possibilidade de ganhar melhor”.
No entanto, indica também que as cidades já estão inchadas o bastante para
fazerem seus bebês urbanos virem em maior número do que os bebês rurais.
Ou seja, as cidades se
duplicam agora sem precisar do empurrão do êxodo rural. Tanto é assim que a ONU
tem uma previsão de estabilidade da população do campo. Até 2018, esse número
chegaria ao ápice de 3,5 bilhões, para em seguida declinar e se estabilizar em
2,8 bilhões, em 2050, dos 9,2 bilhões da população mundial nessa data.
O envelhecimento do mundo é a consequência
Foto: Viva-mundo.com
Cingapura: renda
per capita é de US$ 50 mil, maior do que a dos EUA
Segundo
Laurence C. Smith, o capitalismo e suas revoluções produziram benefícios à
humanidade, mas a um custo alto demais, cujo preço começamos a pagar. Num
parágrafo ele introduz o leitor ao drama vindouro:
“A Era Industrial trouxe consigo
não apenas máquinas e medicamentos, mas também estímulos à migração do campo
para a cidade. As pessoas passaram a comprar cada vez mais o que precisavam, em
vez de produzir e fabricar. O custo da moradia aumentou; a economia cresceu. Um
número maior de mulheres ingressou no mercado de trabalho, reduzindo o número
de filhos que as famílias queriam ou podiam dar-se ao luxo de ter. As taxas de
fertilidade começaram a cair, e o tamanho das famílias diminuiu. Quando as
taxas de fertilidade finalmente caíram, igualando-se às taxas de mortalidade, o
crescimento populacional cessou e as sociedades que haviam participado de tudo
isso sofreram grandes transformações. Em lugar de populações pobres, pequenas,
prolíficas e propensas à morte, surgiram populações numerosas, ricas e longevas,
com poucos filhos.”
O preço é
justamente o envelhecimento do mundo. Neste caso, as nações precisarão investir
mais em previdência e assistência médica. “Essas megatendências têm
consequências pessoais. Eu, pessoalmente, aconselho a quem quiser investir no
mercados financeiro a adquirir ações de indústrias farmacêuticas. Pois, a
partir de agora, começarão a vir idosos por toda parte”, diz o geógrafo.
Megaexemplo
Se o
crescimento populacional é inevitável, fazendo das grandes cidades mega-ambientes
de convivência e conflito, resta trabalhar para descobrir os melhores meios de
uma jornada interminável. Na amostra das tendências, há exemplos negativos como
Lagos, na Nigéria, mas há também os modelos ultrapositivos, como é o caso da
cidade-Estado Cingapura.
“Cidade
portuária situada numa grande ilha no extremo sul da Península da Malásia,
Cingapura começou como uma colônia britânica em 1819 e permaneceu sob domínio
colonial durante 141 anos, até conquistar a independência, em 1960. Desde
então, apesar de seu pequeno tamanho (menos de 700 quilômetros quadrados),
escassos recursos naturais e nenhuma fonte nacional de combustíveis fósseis,
seu crescimento e sucesso econômico têm sido fenomenais”, diz Smith neste texto
veloz e bem informativo.
Cingapura
não tem dez milhões de habitantes, mas é um lugar minúsculo para o gigantesco
progresso que teve. Hoje é “um próspero centro tecnológico, financeiro e de
serviços”, com uma população de cinco milhões de habitantes. É um “fornecedor
global de componentes eletrônicos”, além de estar atraindo investimentos nas
áreas de farmácia, medicina e biotecnologia.
A renda per
capita dos cingapurenses é de US$ 50 mil, maior do que a dos americanos. A boa
administração e o investimento maciço em educação e cultura dão a tônica da
riqueza e da estabilidade da nação. Todas as variáveis em conjunto são o
diferencial do livro de Smith, que é uma instigante provocação a quem se
preocupa com o futuro da humanidade. Mas a análise demográfica é uma lição à
parte.
A marcha da
multidão
Em 1950,
apenas duas cidades tinham mais de dez milhões de habitantes, Nova York e
Tóquio. Vinte e cinco anos mais tarde, em 1975, Cidade do México entrou para o
seleto grupo, do qual nem São Paulo fazia parte. Só entraria na década de 80.
Pouco mais
de meio século depois, em 2007, 19 megacidades a desfilar sua densidade
demográfica. Veja os três quadros que compõem o cenário das megacidades
(contando a população de toda a região metropolitana).
1950
Nova York,
EUA (12,3 milhões)
Tóquio, Japão
(11,3)
1975
Tóquio,
Japão (26,6)
Nova York,
EUA (15,9)
Cidade do
México, México (10,7)
2007
Tóquio,
Japão (35,7)
Nova York,
EUA (19)
Cidade do
México, México (19)
Mumbai
[Bombaim], Índia (19)
São Paulo,
Brasil (18,8)
Nova Deli,
Índia (15,9)
Xangai,
China (15)
Calcutá,
Índia (14,8)
Dhaka,
Bangladesh (13,5)
Buenos
Aires, Argentina (12,8)
Los Angeles,
EUA (12,5)
Karachi,
Paquistão (12,1)
Cairo, Egito
(11,9)
Rio de
Janeiro, Brasil (11,7)
Osaka-Kobe,
Japão (11,3)
Beijing,
China (11,1)
Manila,
Filipinas (11,1)
Moscou,
Rússia (10,5)
Istambul, Turquia (10,1)
Istambul, Turquia (10,1)
...
Nenhum comentário:
Postar um comentário