A memória é a caixa de ressonância da vida. Sem ela o sujeito vira espectro e corre o risco de flutuar como fantasma, perdido no tempo. É a memória que nos dá a noção de espaço e tempo pelo que se já experimentou.
É ela que nos permite recriar o passado para, de alguma forma, compensar o presente, bem como é a memória, aliada à imaginação, que permite um dos grandes trunfos do homem: a criação.
Foi assim, flertando com a vida e com a arte, que em 1995, o jornalista e escritor Carlos Heitor Cony escreveu seu peculiar Quase-Memória: um quase-romance. O livro foi lançado há mais de dez anos, mas ainda pode ser uma novidade. Vale a pena ser lido.
A trama começa quando um porteiro do Hotel Novo Mundo, no Rio de Janeiro, entrega a Cony um envelope. O remetente era o pai do próprio Cony. O problema é que o velho já estava morto há muito tempo. A partir daí, a narrativa em primeira pessoa segue em flashbacks evocados pelo cheiro do pacote, além de outros elementos que reanimam a memória.
O narrador, que é o próprio jornalista, se tranca em seu escritório para avaliar o pacote. E cada vez que toca o tal embrulho, acende-lhe na memória uma luz de fatos do passado ligados a seu pai e a si próprio, como se algo ali estimulasse todos os sentidos, principalmente o tato, a visão e o olfato.
O autor faz do embrulho uma metáfora da memória de seu pai. No princípio, a história parece insípida e quem não tem fôlego não consegue acompanhá-la. Mas depois, pode-se sentir o imenso afeto, a admiração e a saudade do escritor por seu pai nesse livro que pode ser lido como uma espécie de homenagem, uma reparação romanceada.
É como se Cony quisesse reparar alguma indiferença afetiva, ou simplesmente imortalizar o velho pai. É quase memória porque não é sua história de fato, embora haja elementos reais, e é quase romance porque a técnica da narrativa tem uma elasticidade que trai o conceito de romance, ao mesmo tempo que lembra uma história romanceada.
A cada análise feita no embrulho, Cony tira uma casca da memória, como se sua rememoração fosse uma cebola, com várias camadas de lembranças. Além da similaridade aparente com o romance de Proust, Em Busca do Tempo Perdido, há aí uma semelhança entre o texto de Cony com o do escritor tcheko Franz Kafka, que escreveu uma carta ao pai enquanto o velho ainda estava vivo, mas não teve coragem de lhe entregar o escrito.
O pai de Kafka nunca a lera. Depois de mortos, pai e filho, a carta foi publicada e se tornou um grande sucesso literário. Já Cony, por razões diferentes, depois de seu pai morto, também resolveu registrar a admiração e o amor que sentia pelo pai, num quase-romance, ou uma carta indireta, como se fossem apenas reminiscências, escrita em primeira pessoa, mas se dirigindo a terceiros.
É ela que nos permite recriar o passado para, de alguma forma, compensar o presente, bem como é a memória, aliada à imaginação, que permite um dos grandes trunfos do homem: a criação.
Foi assim, flertando com a vida e com a arte, que em 1995, o jornalista e escritor Carlos Heitor Cony escreveu seu peculiar Quase-Memória: um quase-romance. O livro foi lançado há mais de dez anos, mas ainda pode ser uma novidade. Vale a pena ser lido.
A trama começa quando um porteiro do Hotel Novo Mundo, no Rio de Janeiro, entrega a Cony um envelope. O remetente era o pai do próprio Cony. O problema é que o velho já estava morto há muito tempo. A partir daí, a narrativa em primeira pessoa segue em flashbacks evocados pelo cheiro do pacote, além de outros elementos que reanimam a memória.
O narrador, que é o próprio jornalista, se tranca em seu escritório para avaliar o pacote. E cada vez que toca o tal embrulho, acende-lhe na memória uma luz de fatos do passado ligados a seu pai e a si próprio, como se algo ali estimulasse todos os sentidos, principalmente o tato, a visão e o olfato.
O autor faz do embrulho uma metáfora da memória de seu pai. No princípio, a história parece insípida e quem não tem fôlego não consegue acompanhá-la. Mas depois, pode-se sentir o imenso afeto, a admiração e a saudade do escritor por seu pai nesse livro que pode ser lido como uma espécie de homenagem, uma reparação romanceada.
É como se Cony quisesse reparar alguma indiferença afetiva, ou simplesmente imortalizar o velho pai. É quase memória porque não é sua história de fato, embora haja elementos reais, e é quase romance porque a técnica da narrativa tem uma elasticidade que trai o conceito de romance, ao mesmo tempo que lembra uma história romanceada.
A cada análise feita no embrulho, Cony tira uma casca da memória, como se sua rememoração fosse uma cebola, com várias camadas de lembranças. Além da similaridade aparente com o romance de Proust, Em Busca do Tempo Perdido, há aí uma semelhança entre o texto de Cony com o do escritor tcheko Franz Kafka, que escreveu uma carta ao pai enquanto o velho ainda estava vivo, mas não teve coragem de lhe entregar o escrito.
O pai de Kafka nunca a lera. Depois de mortos, pai e filho, a carta foi publicada e se tornou um grande sucesso literário. Já Cony, por razões diferentes, depois de seu pai morto, também resolveu registrar a admiração e o amor que sentia pelo pai, num quase-romance, ou uma carta indireta, como se fossem apenas reminiscências, escrita em primeira pessoa, mas se dirigindo a terceiros.
Quase-memória foi o décimo romance de Cony, publicado 22 anos após Pilatos, de 1973, com o qual o autor pretendia encerrar sua cota de romances. Mas, depois de Quase-memória já escreveu outros, muito ruins por sinal. Como romancista, deveria ter parado por ali mesmo.
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