Artista cubano Wilfredo Lam em foto-montagem publicada no site Afropunk.com |
Entre
as diversas mostras em cartaz no Museu Oscar Niemeyer (MON), em Curitiba, agora
em julho, a do Wifredo Lam (1902-1982) me chamou a atenção, não por ser uma
obra toda marcada pelo surrealismo e o cubismo, flertando o tempo todo com
Picasso, havendo inclusive uma imensa foto do pintor com seu mestre, mas pelo
sincretismo que nos arrebata. A mistura dos credos entre o cristianismo, o
imaginário chinês e as religiões afros são sensacionais.
Lam é negro e chinês ao mesmo tempo. Seu cabelo afro e seus olhos orientais são imaginados na configuração da sua obra, antes mesmo de lermos seu nome ou vermos sua figura. Há dragões e pretos velhos recortados pela geometria cubista dos quadros. Adorei conhecer esse artista cubano.
Artes visuais não são minha praia, infelizmente (se é que tenho alguma), mas tenho aprendido tanto com esse lance de espaço e textura, e sobretudo com a ideia de narrativas no interior do quadro, quando não uma alegoria inteira por meio do jogo de luzes, linhas e espaços que flerta com meu imaginário, que acabo vislumbrando a história da arte e as grandes narrativas, os grandes mitos, os discursos antropológicos e psicológicos das formas.
Tenho aprendido tanto com isso nos últimos anos que já faz parte da técnica de mover espaços e redesenhar caminhos com as palavras em meus textos. Achei que à medida que eu fosse envelhecendo, eu fosse desistindo das letras, parando de ler, aceitando a morte da palavra dentro de mim. Mas tudo isso está vivaço. Tudo isso é vida, é o universo dançando e me conduzindo na dança da existência.
Infelizmente, um passeio pela mostra de um artista não é suficiente para quase nada. Eu teria de ver Lam muito mais vezes. Mas posso complementar essa visita com outras visitas a outros artistas, ler livros, ver filmes, e continuar a jornada da vida e da arte. Cada um, em sua inteireza de consciência, escolhe o modo como quer exercitar sua existência. Escolhi passear no bosque das artes, já que não posso viver dentro dele.
Lam
reavivou isso de algum modo, inclusive porque me fez lembrar de um escritor
cubano respeitável esteticamente, com uma narrativa que não faz concessão a
ninguém, nem mesmo no nome, Severo Sarduy (1937 - 1993), na novela De donde son los cantantes (onde
pretos, brancos e orientais se misturam de modo incrível), que me levou à
canção popular cubana, à dança, à cultura cubana, e me deixou um pouco mais
conhecedor desse povo tão rico.
Se
de um lado Cabrera Infante (1929 - 2005) me apresentou ao cheiro, à
sensualidade e à vida cubana de modo geral, Sarduy me envolveu na mistura de
cores e significados que é esta mesma cultura. Lam pareceu-me tudo isso, ou
pelo menos me levou a tudo isso. Estou vivo. Viva Cuba. Cuba livre. Cuba Libre!
Tintim!