segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Tempo e ritmo


O tempo é uma relação de causa e efeito com o espaço e o movimento dos corpos. É uma relação que interage não só na cultura humana, mas em toda a cadeia animal, pois o tempo passa por todos os seres e age sobre todos os reinos. Mas no entendimento humano, no plano da consciência, o tempo torna-se mais complexo porque se bifurca. Neste caso, há o tempo exterior, a passagem dos dias que cotidianamente acompanham os organismos funcionando e se desgastando, e o tempo interior do homem, que o segue e o pressiona na construção da subjetividade. É nesse mar de tempo, com o sujeito se contrapondo à exterioridade, que a vida nada.

Essa experiência temporal está ligada a praticamente tudo na nossa existência, e é a responsável direta pelo exercício da inteligência humana. A inteligência treinada sabe dosar a dinâmica do tempo com a intuição sobre aquilo que virá. E é aí que entra outro componente fundamental, o ritmo. Nos passos dessa dança gira quase tudo.

Em 1998, o biólogo britânico Richard Dawkins escreveu um livro lindo, na malograda tentativa de convencer os poetas de se inspirarem na ciência. Não é demérito o malogro, mesmo porque trata-se de um fracasso apenas na visão de quem vê a poesia como espaço da liberdade forjada pelo engenho imaginativo. Os poetas querem dar asas à imaginação, e a ciência as podaria com a navalha de Ockham.

Nesse livro, intitulado Desvendando o arco-íris: ciência, ilusão e encantamento, Dawkins fala de mil coisas belas que a ciência pode proporcionar à criatividade poética, mas a única sensata é a noção de ritmo, justamente porque ela se aplica à vida toda. Ele fala do ritmo biológico, o ciclo da vida atrelado à dança do universo, à dinâmica do espaço que tudo rege, na pulsação sem fim das estrelas e nas jornadas noite e dia dos objetos espaciais.

O ritmo realmente decanta a vida, encanta os sentidos. Cada célula tem um tempo e um espaço adquirido para ir se transformando. Cada pessoa caminha de um jeito, corre, come, respira, dorme e se levanta de um modo específico. O amor surge e desaparece em ritmos que dependem de cada um de nós. Tempo e sexo (ninguém atinge o orgasmo do mesmo modo, nem na extensão temporal, nem no jeito de mover os corpos entrelaçados). Tempo e vida. Tempo e jogo. Amor e tempo.

Segundo Dawkins, na dança do universo, dos diversos ritmos que marcam a passagem dos objetos no espaço, como o ritmo orbital da Terra de 365 dias em torno do Sol, o mais trágico é o ritmo de extinção que traz um fenômeno catastrófico a cada 250 milhões de anos. A última vez que esse comprimento de onda nos atingiu há 65 milhões de anos matou 90% dos seres vivos e dizimou os dinossauros. Mas há outro comprimento de onda que nos atinge a cada 26 milhões de anos. Nem saias rodadas, nem meneios esplêndidos. No universo, a dança às vezes é fúnebre demais.