terça-feira, 17 de maio de 2016

O marxismo e o fracasso da salvação


Rumo à Estação Finlândia, de Edmundo Wilson, narra a aventura humana pela concretização de uma sociedade mais justa. No rastro dos grandes pensadores sociais, o livro é uma espécie de crônica de um tempo memorável, fazendo ressurgir no papel nomes caros à criação do socialismo, como Babeuf, Saint-Simon, Fourier, Robert Owen, além de Karl Marx e Friedrich Engels, os fundadores do marxismo.

Estação Finlândia é uma referência ao local para onde foi o líder marxista russo Vladimir Lenin, saindo de Londres, seu exílio, antes de seguir viagem para assumir o comando do governo revolucionário, que viria a se tornar um dos maiores totalitarismos da história com Stálin, prova de que na teoria a prática às vezes é outra.

O livro de Wilson não desbrava o totalitarismo russo. Finaliza com a chegada de Lenin a Moscou em 16 de abril de 1917. O filé da narrativa é mesmo o retrato daqueles espíritos pregressos, fora do comum com suas qualidades e defeitos. E Karl Marx foi o mais brilhante e fecundo deles.

Marx abdica da própria carreira profissional, e até do bem-estar da família, para lutar por amplos direitos em favor do proletariado. Por causa disso, ele se afunda na pobreza também. Sua penúria é comovente à medida que se imagina um homem dedicando seus melhores dias à causa dos excluídos, e por isso, de igual modo, se excluindo.

O trágico dessa história é que esses excluídos contemporâneos de Marx podem ter passado a vida toda sem saber do empenho do autor de O Capital. Por outro lado, havia também certa irascibilidade por parte dele em relação ao proletariado, além de demonstrar arrogância e pendores racistas contra seus críticos e desafetos.

Nasce o socialismo
Os novos pensadores sociais argumentavam que a sociedade era uma criação humana e que, portanto, podia-se reorganizá-la de acordo com a justiça e a igualdade de direitos entre os homens, sem a exploração de uns sobre os outros, como sempre havia ocorrido (e aumentado na Revolução Industrial).

E assim surgiu o socialismo. No seio dele, Karl Marx criou o marxismo com o auxílio do milionário e pensador social Friedrich Engels. É gostoso ler Rumo à Estação Finlândia pelo brilhantismo da narrativa de Edmund Wilson, pelas histórias de heroísmo fracassado dos grandes pensadores, inclusive o próprio Marx.

Segundo Wilson, Marx errou feio em duas premissas básicas. Primeiro imaginava que a Inglaterra industrializada abriria um abismo cada vez maior entre operários e patrões, e isso causaria a revolução comunista. Houve o abismo, mas “a progressiva degradação da classe operária teve simplesmente o efeito de atrofiar os trabalhadores fisicamente, e pouco a pouco extinguir-lhes o espírito.”

O outro equívoco, segundo Wilson, foi o de achar que os trabalhadores, pobres e analfabetos, com um mínimo de instrução se conscientizariam e se revoltariam com a exploração a que eram submetidos. “Mas agora sabemos que, quase invariavelmente, quando o povo pobre e analfabeto de uma sociedade industrial moderna aprende a dominar as técnicas mais avançadas e melhora seu padrão de vida tende a exibir ambições e gostos burgueses.”

Em todo caso, o marxismo ainda serve como valiosa interpretação do modo como um grupo poderoso pode explorar a massa de infelizes que não tem para onde correr, a não ser para a própria força social que raramente percebe que têm.

O que faz a diferença no livro de Wilson é sua sensibilidade aberta ao outro, sobretudo ao outro diferente de sua realidade pequeno-burguesa, o outro que soube construir pontes resistentes por meio das quais um séquito de explorados se reuniu com a intenção de mudar o mundo (história das ideias). Tudo que eles falaram foi em nome do povo, em defesa de um novo tipo de relação social, na qual não houvesse mais exploração.

Neste sentido, Rumo à Estação Finlândia é um livro que retrata idealistas sociais, homens sensíveis ao sofrimento alheio, que (parafraseando Graco Babeuf) pensavam em maneiras de proporcionar à espécie humana a igualdade e retirar das costas dos mais vulneráveis o peso da exploração.

Wilson identifica a história moderna como um trem com muitos vagões cuja locomotiva são Marx e Engels. Esses caras mudaram o rumo dos acontecimentos, fizeram a humanidade seguir numa outra bitola (e leva-se em conta aqui o trocadilho também).



...

Nenhum comentário: