terça-feira, 25 de março de 2014

Casa Grande & Senzala: uma releitura mínima


No início do capítulo IV de Casa Grande & Senzala, Freyre diz:

Todo brasileiro traz na alma “a sombra, ou pelo menos a pinta, do indígena e do negro.” Depois, entre lengas e molengas, ele completa: todo brasileiro (e aí, parece-me que ele já está falando, eis a minha leitura, todo brasileiro branco, ou herdeiro da brancura que fez desse brasileiro senhor) traz essa sombra ou essa pinta, “na ternura, na mímica excessiva” (…), da “negra velha que nos contou as primeiras histórias.”

E aí, ele continua lá na frente, “da que nos iniciou no amor físico e nos transmitiu, ao ranger da cama-de-vento, a primeira sensação completa de homem.” Aqui ele tá de sacanagem, né? Teria de dizer: da que foi estuprada, aliciada, seduzida entre aspas, ameaçada para ser levada para a cama pelo senhorzinho, fazendo-o homem e ela sendo transformada em negra de cama, imagem que perdura.

Depois Freyre prolonga, em sua prosa deliciosa, digna de um Nobel de Literatura.

Todo homem (todo brasileiro branco, ou herdeiro da brancura que fez desse brasileiro senhor) traz essa sombra ou essa pinta “do moleque que foi o nosso primeiro companheiro de brinquedo.” Fala sério! Pergunte ao Brás Cubas. Melhor seria dizer: do moleque que foi nosso primeiro brinquedo.

Mas, o mais importante a perceber nesse trecho é o pronome nós. Freyre se inclui no discurso e demonstra que ele fala do branco herdeiro da Casa Grande.

Eu quero é ver quando Zumbi chegar, nénão, Jorge! Queria ter um amigo que voasse.

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