
Aos 61 anos de idade, o escritor paranaense Wilson Bueno foi encontrado morto em sua casa, em Curitiba, na noite de segunda-feira, 31. Passei um tempo querendo entrevistá-lo, e sempre adiava. Agora, o adiamento se estende à eternidade.
Um de seus livros mais expressivos, do ponto de vista literário, é o romance Meu tio Roseno, a cavalo, de 2000. Ali, Bueno cria uma espécie de geografia poética do interior do Paraná, à medida que o cavalo avança. O narrador, sobrinho de Roseno, conforme diz o título, descreve num plano a aventura do herói na volta para casa a fim de ver sua filha nascer, e em outro plano, narra as atrocidades de uma guerra fictícia, a Guerra do Paranavaí, que pode ser a sangrenta Revolta do Contestado, embora as datas não coincidam.
Roseno tinha de chegar a Ribeirão do Pinhal a tempo de assistir ao nascimento da filha, Andradazil. Ele então viaja 50 léguas e meia em sete dias.
Em homenagem a Bueno, eis aqui uma pequena mostra de sua lavra:
“Com o entardecer que faz sobre a cabeça, mais um motivo para compreender tudo, e o que este céu tem para dizer, agora que imensas as nuvens se estiram, dourado-velhas, chumaços coral e âmbar, aqui ali desmaiando num quase lilás ou ascendendo às tintas de roxo supremo, transgressor.”
“E foi como que sob o segundo entrecéu desta história trotada no vento, cavalo e cavaleiro, a lagoa e o grasnar de seus batráquios, e todo o universo ainda antes de Andradazil, florestas e árvores, capim e água, cruzes e ossos a Xuguari e o Gruxal, como que ao segundo entrecéu desta lenda molhada de rios, tocado pelo movimento das nuvens e da lua, oblíquo e suspenso debaixo do firmamento, o mundo inteiro andasse.”
No valoroso romance Chá das cinco com o vampiro, de Miguel Sanches Neto, em que o autor cria personagens com características de escritores paranaenses, Bueno aparece como Uílcon Branco, um escritor de comportamento pouco elogiável e dono de uma literatura ausente de verdade. Sanches Neto, que é do interior do Paraná, assim como Bueno, embora de cidades diferentes, não quis ou não soube reconhecer o valor literário de seu conterrâneo.
Entre seus livros também estão A copista de Kafka, Amar-te a ti nem sei se com carícias, Cachorros do céu, e um livrinho de tankas (gênero de poesia japonesa) chamado Pincéis de Kyoto, que eu ainda estou sorvendo como quem bebe um cálice do mais precioso vinho.
Comecei um contato com Wilson Bueno há alguns meses e esta notícia me deixa muito triste.
ResponderExcluirA notícia também me entristece. Embora eu não o conhecesse pessoalmente, como autor, acho que é uma perda importante.
ResponderExcluirEu não conheço a obra dele ainda, mas sei que é um escritor importante e que eu devia tratar de conhecer. Uma lástima essa violência.
ResponderExcluirAbraço
Oi, Leila! Pois é. Uma tragédia curitibana. Nada justifica a estupidez de matar. Você, que é versátil e leitora de obras universais, provavelmente vai gostar de ler Meu tio Roseno. Não gosttei de A copista de Kafka, mas também não passei do segndo conto, deixei de lado. Mesmo assim, Bueno era um escritor de primeira linha. Era meio marrento, é verdade, mas nada tira-lhe o brilho. Nem mesmo a morte, creio. Haverá sempre alguém que tropeçará em um de seus livros e saberá apreciar.
ResponderExcluirGrande abraço, Leila!