quarta-feira, 1 de julho de 2015

Wolverine

Wolverine é um dos mais emblemáticos personagens da série em quadrinhos X-Men, da Marvel. Quando o cinema começou a saga desses heróis, em 2000, o único que funcionou, mostrando-se em sua grandeza, foi ele (a atuação de Hugh Jackman reforçou o carisma do personagem, sem dúvida). Os outros se curvaram à sua sombra. Protagonista solo de dois filmes, X-Men Origens: Wolverine e Wolverine – Imortal, já tem outra sequência em produção.

Wolverine é um ícone dessas figuras imortais que não são deuses e que veem a imortalidade como maldição. Personagem angustiado e revoltado, ciente de nossa miséria, ele carrega para sempre a clareza da desgraça humana. Todos os outros X-Men podem morrer, ou estão envelhecendo aos pouquinhos, até que um dia só restará uma carcaça mutante definhada. Wolverine, não. Com capacidade regenerativa absurdamente desenvolvida pela mutação genética, suas células estacionaram na dimensão do eterno.

É o personagem mais trágico dos X-Men, o mais dionisíaco e por isso mesmo o que mais faz sucesso entre os fãs. Talvez porque tente amar. Apesar dos percalços, quer sentir o coração pulsando. Em Wolverine - Imortal, ele aparece em sua microtragédia, de modo inverso, repetindo o velho refrão poético que fala do sonho dentro de um sonho ("dream within a dream"), tendo pesadelos dentro de um pesadelo.

A verdade é que nosso herói não pode amar ninguém, porque todos que ama morrem. Não pode dormir com alguém, porque acorda no meio da noite com as afiadas garras de metal armadas e matando quem está do seu lado. Foi assim que feriu Jean (a Fênix), mutante poderosa e a mulher que ele amava. Seu pesadelo agora é sonhar com essa cena, em que vê a amada ao seu lado na cama e diz: "Não vou mais te ferir". Serenamente, ela diz: "É tarde demais." Ele olha e vê sua garra enfiada no ventre dela. Mais uma vez, desperta atordoado.

A morte é uma espécie de buraco negro móvel, que sempre ronda nossas sombras até que um dia acaba nos abocanhando de vez. É um emaranhado de fios delicados em meio à maçaroca da vida. Neste sentido, os atributos construídos para um sujeito que sofre de imortalidade nos ensinam sobre o caráter da vida que passa.

A imortalidade é uma quimera paradoxal, é apenas um modo de se referir à extensão indefinida de um tempo que vai além do tempo dos outros. Todo mundo morre, até os deuses. Há incontáveis maneiras de morrer, e nem sempre é uma maneira honrosa. O suicídio, para muitas culturas, é um modo terrível e ultrajante. Wolverine não quer morrer assim. É um herói. Mas se lança à procura da morte, sem encontrar uma força capaz de lhe tirar a vida.

O resultado dessa equação é a angústia de ser um herói imortal. Todo herói põe sua vida em risco para salvar o outro. Wolverine faz isso também. Mas todo herói tem uma fraqueza que, se descoberta, é sua ruína. Não Wolverine.

(Gilberto G. Pereira. Publicado originalmente no jornal O Popular, 27/06/2015)

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